segunda-feira, 28 de junho de 2010

O Tempo constrói


Digamos que antes de tudo só existia o vácuo absoluto e o tempo, depois, por algum processo ainda desconhecido, surgiu um universo em expansão. Centenas de milhões de anos foram gastos no processo de produção dos elementos necessários para a confecção das estrelas; após a morte e a explosão de uma estrela, foi preciso mais tempo ainda para a incorporação desses elementos até formarem um planeta como a Terra, por exemplo. Só depois do Planeta formado, com as condições ideais, surgiu a vida de alguma forma ainda não conhecida. Portanto, devemos admitir que para que haja tempo para construção dos seres vivos, o universo terá que ter bilhões de anos, ou seja, terá que ter muito tempo.
Olhar para o firmamento e contemplar a abóbada com milhares de estrelas visíveis e milhões de outras imagináveis, deveria nos dar a dimensão exata de nossa pequenez; deveria nos fazer sentir o grão de poeira insignificante que somos; deveria lembrar que não somos os senhores ou controladores daquilo que vemos ou podemos imaginar; deveria nos ensinar que existe uma entidade, e somente uma, que define a existência ou não de tudo, o inescrutável tempo.
Tudo que vemos deveria inspirar não somente o exercício da humildade, mas nos obrigar a reverenciar a entidade dona absoluta do destino, o tempo. De fato, o tempo é a única entidade que permanecerá depois de nós, depois das coisas, depois do Universo, depois de tudo. Podemos deduzir que o tempo tudo construiu e a tudo suplantará, ele próprio é imune ao tempo.
A natureza é prova viva de quanto o tempo pode criar, de que ele tem um objetivo, no qual nos incluímos, somos uma criatura do tempo. Criador fecundo, o tempo assegura a existência de tudo até quando não houver mais tempo na existência dos seres e das coisas quando, então, a vida, as coisas e próprio Universo deixarão de existir, então restará apenas o vácuo absoluto e o tempo, depois, por algum processo ainda desconhecido... JAIR, Floripa, 23/06/10.

sexta-feira, 25 de junho de 2010

O Tuaregue


No norte da África, região que abrange Argélia, Líbia, Marrocos, Tunísia e Egito, área ocupada pelo Saara, existem tribos de nômades que não tem pátria, não se consideram pertencentes a nenhum país em particular e não respeitam fronteiras físicas entre nações, são os Tuaregues.
Também chamados berberes por falarem o berber, língua aparentada com o árabe, mas com ricas entonações que lha confere pronúncia menos gutural, e que tem um vocabulário próprio quase intraduzível. Os tuaregues são pastores coletores, criam cabras, ovelhas e camelos e costumam coletar tâmaras e azeitonas. São artesãos e ourives habilidosos. Costumavam comercializar diversos produtos, tais como: objetos de prata, ouro, ferro e cobre, artesanato, temperos, vidro, plumas, pedras preciosas, e, sobretudo, extraem sal das planícies salgadas e o vendem nas cidades onde compram gêneros que necessitam. Confeccionam sofisticadas tapeçarias e tecidos de lã de ovelhas e pêlo de dromedários. Eventualmente, algumas tribos assentam-se por tempo suficiente em algum lugar mais aprazível dos oásis e também plantam hortas e pomares, atividades que não chega a lhes conferir a classificação de agricultores, visto que essa labuta se aplica somente a algumas poucas tribos e durante pouco tempo.
O termo Tuaregue é árabe e quer dizer “abandonado pelos deuses”, mas os assim nomeados preferem chamar a si mesmos de Imashaghen ("os Livres"). Como suas vidas são um constante perambular pelas dunas, planícies de areia e oásis do Saara, e como não tem que dar satisfação a nenhuma autoridade a não ser a eles mesmos, parece que Livres é o que eles realmente são. Nada mais próprio.
No século dezenove, quando o norte da África estava colonizado pelos europeus e estes tentavam “europeizar” os países por eles ocupados, surgiu a idéia de mecanizar a produção de sal da região, em especial no Egito onde eram os ingleses que dominavam. Só que a coleta transporte e comércio do sal são e sempre foram atividades econômicas dos Tuaregues, estes viajam, às vezes centenas de quilômetros, até as salinas e trazem o produto para as cidades da região desde tempos imemoriais. Esse comércio é essencial, permite que sobrevivam os que não têm rebanhos, que são menos habilidosos, ou quando suas outras atividades não estão rendendo o suficiente.
Pois bem, quando os ingleses tiveram a brilhante idéia de coletar mecanicamente o sal em região mais próxima aos consumidores por que saía mais barato, muitos nômades estavam justamente numa época de “vacas magras” e necessitavam com grande premência do faturamento desse comércio. Por sorte, algum inglês menos obtuso conseguiu enxergar que por causa da economia de umas poucas libras poderiam decretar a extinção de um povo que há milênios vive ali sem incomodar ninguém. E assim, desistiram do projeto, deixando que os Tuaregues continuassem trazendo o sal das lonjuras e continuassem vivendo. Bom para eles e parabéns para os colonizadores que, num ato de ‘bondade’, ajudaram a preservar a cultura exótica desse milenar povo meio misterioso e rebelde.
Bem, e daí cara pálida? Daí descobri que os árabes que invadiram e dominaram a Península Ibérica de 711 a 1542 eram, na sua maioria, berberes, ou seja, Tuaregues. Descobri também que meu antepassado espanhol mais remoto conhecido, meu bisavô Francisco Lopes, era descendente direto de Tuaregues, filho de pais Tuaregues de quarta ou quinta geração, vivendo na Espanha e “iberizados” culturalmente, bem como convertidos ao cristianismo. Descobri que o Lopes do sobrenome dele (e meu, naturalmente) é uma corruptela do latim lupus (lobo em espanhol) como eram chamados pelos espanhóis os berberes, por serem temerários, audazes e causarem terror aos ibéricos, os quais tinham conquistado. De lupus = lobo, descendem os sobrenomes Lupo, Lupi, Lupe, Lope, Lopes, Lopez, bem como Guadalupe, Lupinacci e outros.
Então, minha gente, como sou fissurado pela história e figuras dos berberes e até já reproduzi algumas em óleo sobre tela, estou propenso a acreditar que sou descendente desses resistentes e bravios nômades do deserto. Acho que alguma partícula atávica e memorial fica escondida em algum recanto do código genético da gente e surge em forma de lembranças algum dia. Se assim é, devo ser um por cento Tuaregue!
Mais uma vez, e daí? Daí é reconfortante a idéia de conhecer nossas origens, sejam elas de degredados criminosos portugueses obrigados a colonizar um novo território; seja de simplórios indígenas maltratados e catequizados pelos colonizadores; seja de negros escravizados e brutalizados por uma política de exploração desumana; ou de imigrantes europeus que fugiram da aviltante miséria de seus países de origem e vieram dar com os costados aqui no acolhedor Patropi. JAIR, Floripa, 25/06/10.

terça-feira, 22 de junho de 2010

Os Gnomos existem!




Primeiro, o que a Wikipédia diz a respeito de gnomos: “Os gnomos são espíritos de pequena estatura amplamente conhecidos e descritos entre os seres elementais da terra. A origem das lendas dos gnomos terá muito provavelmente sido no oriente e influenciado de forma decisiva a cultura antiga da Escandinávia. Com a evolução dos contos, o gnomo tornou-se na imaginação popular um anão, senão um ser muito pequeno com poucos centímetros de altura. É comum serem representados como seres mágicos não só protetores da natureza e dos seus segredos como dos jardins, aparecendo como ornamento. Usam barretes vermelhos e barbas brancas, trajando por vezes túnicas azuis ou de cores suaves”. O que a enciclopédia não diz, mas é de conhecimento geral, é que existem gnomos que praticam o bem e os que só fazem o mal. Dizem que os gnomos malignos são facilmente reconhecíveis porque não têm pescoço.
Pois bem, apesar de serem vistos com muita frequência por grande número de pessoas durante gerações em todas as partes do mundo, ainda há gente que não acredite neles. Por isso, quero dar meu testemunho isento, produto de minha seriedade no trato de assuntos polêmicos.
Durante esta Copa de Futebol, enquanto o time da Argentina está em campo, tenho visto com estes olhos de cuja acuidade visual pode-se dizer que é ótima (20 x 20), um GNOMO na beira do campo. Juro, vejo-o sempre, ele está vestido de terno e gravata – certamente como disfarce – e gesticula muito, acredito que tal entidade é até religiosa, porque costuma fazer gestos ritualísticos compatíveis com a prática religiosa cristã. O homúnculo ridículo parece ter alguma influência sobre os jogadores argentinos, pois estes o cumprimentam e até o beijam ao saírem de campo.
Então, senhores céticos, prestem um mínimo de atenção e vejam o funesto ente que muitos dizem não existir, mas que, pela falta de pescoço, deve estar praticando algum ritual maldoso contra os inocentes jogadores de outros países. JAIR, Floripa, 22/06/10.

segunda-feira, 21 de junho de 2010

Ensaio sobre a Guerra


"Bellum omnium contra omnes"

Vejamos um conceito bem acadêmico de guerra: “Guerra é uma disputa entre nações ou estados, realizada pela força, quer para a defesa, com intuito de vingar insultos e corrigir erros, visando ampliação do comércio, objetivando aquisição de território, para a obtenção e estabelecimento de superioridade e/ou domínio de um sobre o outro, ou para finalidade inconfessável; conflito armado de poderes soberanos; declarados e hostilidades abertas”.
Qualquer que seja o motivo que resulte em guerra, a verdade é que o estado de guerra subverte a estabilidade das comunidades envolvidas no conflito, deteriora a estrutura da sociedade e traz insegurança, seja no nível individual seja para a coletividade.
O estado de guerra determina o rompimento dos valores éticos que norteiam a conduta cívica dos homens; abole os princípios religiosos que pregam o perdão e a oferta da outra face ao ofensor; detona as leis e costumes que punem aquele que mata; esgarça o tecido social de modo a torná-lo roto, sem coesão.
De maneira geral, abala não só a relação de uns com outros, mas a noção de espaço e tempo. Explico, o espaço físico se torna local de insegurança ou de refúgio de acordo com as condições reinantes. O tempo passa a ser fator de incerteza, não se sabe o que acontecerá amanhã e, em alguns casos, o vai acontecer daqui a minutos.
Entrar em estado de guerra é, na verdade, adentrar um mundo paralelo, uma zona cinzenta onde comportamentos antes reprováveis, e valores antes invioláveis, passam a ser normais os primeiros e desprezados os segundos. Quem nunca matou e tem a convicção religiosa do pecado que isso representa e a noção social de crime passível de punição, passa a ter carta branca para fazê-lo, sem maiores consequências. Matar seu semelhante deixa de ser crime para se tornar um dever ou uma missão, e não matar passa a ser traição. A lógica se inverte e a mente do indivíduo entra em choque.
O fim da proibição de assassinato (crime maior) acarreta a tolerância implícita com estupros, violações e roubos (crimes menores), dentro da concepção: Nós contra Eles. Eles são aqueles os quais se pode matar, violentar e roubar sem punição. Não importa que “Eles” sejam os amigos ou os inocentes de ontem, a propaganda se encarregou de demonizá-los, de modo que hoje são nossos inimigos. Todo estado de guerra é precedido de propaganda que estabelece quem é o inimigo, porque é inimigo e o que fazer para livrar-se dele. Não importa que a razão e a verdade sejam manipuladas, isso apenas comprova que quando o conflito começa, “a verdade é a primeira vítima”.
O medo, que antes era um conceito vago ou uma realidade apenas pressentível diante de eventos que gerassem insegurança física, emocional ou social, agora passa a ser uma entidade viva e palpável, uma presença angustiante que causa estresse e se imiscui pelos interstícios mais banais da vida diária. O medo interfere na fisiologia humana, tira o sono e o apetite, causa palpitação, contrai os músculos e diminui o metabolismo, pessoas acometidas de medo crônico, embora tendam a comer em demasia em função da ansiedade, não digerem com eficiência e emagrecem, crianças submetidas a medo constante deixam de crescer, têm diarréia, pesadelos e tornam-se irritadiças. Medo é uma espécie de desconforto existencial extremo que não tem tratamento, não tem como evitar ou lenir, e acomete a todos mentalmente sãos, só os insanos lhe estão imunes, só os alienados lhe são indiferentes.
A morte é o único evento absolutamente inevitável e que alcança a totalidade dos seres vivos, mas nós, ocidentais de cultura judaico-cristã, não temos familiaridade com ela; não consta no curso do dia-a-dia de nossas vidas quaisquer práticas, cultos ou ritos que visem enquadrá-la num entendimento racional. Temos pavor dela e tentamos ignorá-la como se não existisse, como se fôssemos viver para sempre. Claro que essa atitude pode ser explicada pelo terror que alguma coisa tão definitiva e irrefragável causa a mentes pensantes, cujo funcionamento só é possível enquanto vida houver. Contudo, o estado de guerra traz a morte para dentro e casa, por assim dizer. A morte passa a “dividir espaço” com as coisas do dia-a-dia, ela se torna presente e opressiva, não há como escapar de sua inevitável possibilidade a qualquer momento. Ela é apavorante e traz terror para a vida dos inocentes da comunidade em guerra.
Conquanto nos últimos dois mil anos a humanidade só esteve em paz nuns poucos cem anos, o estado de guerra não pode ser considerado, sob o ponto de vista social ou emocional, um estado “normal”, não é algo que os seres humanos assimilam e convivem sem traumas, o estado de guerra é uma anomalia. O homem, ao guerrear contraria seu instinto de sobrevivência, ou seja, ele mata seres de sua espécie que poderiam dar seguimento à perpetuação; que poderiam ser elos férteis na corrente genealógica do Homo sapiens; ao eliminar seus semelhantes está, de certa maneira, se auto-eliminando, eliminando a própria humanidade. Hobbes tinha razão, “Homo homini lupus” (O homem é o lobo do homem), não tenhamos dúvida. JAIR, Floripa, 21/06/10.

sexta-feira, 18 de junho de 2010

Réquiem para um artista das palavras



As artes e a ciência têm seus pontos altos quando surge no cenário alguma mente que brilha. Assim foi quando surgiu Da Vinci, Newton, Einstein, Picasso, Camões, Dante e outros luminares. O Século vinte e um contava até o dia de hoje com o maior escritor da língua portuguesa depois de Camões, José Saramago (1922 – 2010). Morreu um escritor de imaginação poderosa que criava estórias fantásticas e as colocava em palavras com uma elegância que não se via nas letras desde Cervantes. Quem lê Saramago se transporta para um mundo imaginário com pinceladas de realidade que dão uma verossimilhança às estórias que nada deixam a desejar frente a Garcia Marques, por exemplo.

José Saramago dominava o idioma e o fazia moldar-se a seu jeito, sem conspurcar-lo sem agredi-lo, era capaz de escrever sem pontos finais um capítulo inteiro sem, contudo, entediar o leitor ou tornar o texto menos compreensível. A vírgula, ela a usava com uma propriedade nunca vista antes, era um mestre, dava-se ao direito de criar sua própria versão da última flor do Lácio.

O mundo, e especialmente a literatura da língua portuguesa, perdeu hoje não só um prêmio Nobel, mas uma mente que, ao brilhar, iluminava nossas prosaicas vidas de leitores.

Saramago, você que não acreditava numa vida após a morte, deve estar se diluindo no espaço-tempo, doando sua matéria para alguém ou alguma coisa que vier depois e que a usará para um propósito nobre, esperemos. Adeus, Picasso das letras. JAIR, Floripa 18/06/10.

PS - Para quem ainda não leu, recomendo: "As intermitências da Morte"

terça-feira, 15 de junho de 2010

Sobre Futebol



Clima de copa do mundo, todos respirando futebol, nada mais próprio do que lembrar João Saldanha (1917 – 1990), gaúcho de Alegrete, mas de vida familiar e profissional no Rio de Janeiro desde os 14 anos. Falar de futebol sem citar Saldanha é o mesmo que degustar a sobremesa sem comer o prato principal. Seu pai, amigo de Getúlio Vargas, foi contemplado com um cartório na zona sul do Rio, razão pela qual Saldanha pertencia a classe média alta. Comentarista polêmico, botafoguense, ex-jogador profissional, jornalista, escritor, erudito, formado em direito e filiado ao PCB sem ter sido militante. Nas eliminatórias de 1970 era técnico da seleção brasileira e classificou o Brasil invicto com um time conhecido como “as feras de Saldanha”, diz a história que o Presidente Médici mandou defenestrá-lo porque não ficava bem ao Brasil ser campeão tendo como técnico um comunista. Vejamos o que o Saldanha declarou a respeito: “Eu sabia que a Seleção estava desmoralizada. O Maracanã não enchia nem contra a Seleção da FIFA, nem contra a Argentina. O povo não acreditava mais. Eu achava que devia promover o nosso futebol. Provocar, chamar a atenção pra cima da gente, pra cima de mim se fosse preciso. Fui por aí, enfrentando as paradas. De repente surgiu uma crise. Se me perguntarem hoje porque fui demitido, palavra de honra, juro pela Teresa e pelas crianças que não sei. Porque não me deram nenhuma explicação, tentaram fazer com que eu pedisse demissão. Disseram que a Comissão Técnica estava dissolvida”.
Pois bem, havia quem não gostasse dele, havia quem o achasse pedante, havia quem o acusasse de comunista, havia os que viam nele um bon vivant rico que apenas curtia a vida, outros diziam ser um play boy bem sucedido meio falastrão e irresponsável, contudo, uma coisa ninguém pode negar, o cara era profundo conhecedor da história dos esportes, com justiça muitas vezes chamado de enciclopédia do futebol.
Escrevia crônicas sobre história do futebol e esportes em geral recheadas de informações interessantes e curiosas. Uma dessas crônicas, “Tirem o Bedel!”, quero comentar aqui. Pois bem, existem perguntas pertinentes que os apreciadores do futebol às vezes fazem e não encontram respostas como: Por que onze jogadores? Por que dois tempos de 45 minutos cada? Na crônica, João Saldanha, contando a história recente do esporte bretão, dava uma bela pincelada nos fatos que originaram onze jogadores e 45 minutos por tempo num jogo.
Conta ele que, no início, na Inglaterra, no ano de 1848, numa conferência em Cambridge, estabeleceu-se um único código de regras para o futebol. No ano de 1871 foi criada a figura do guarda-redes (goleiro) que seria o único que poderia colocar as mãos na bola e deveria ficar próximo ao gol para evitar a entrada da bola. Em 1875, foi criada a regra do tempo de 90 minutos. O tempo duração do jogo assim ficou estabelecido porque o jogo era praticado, como esporte obrigatório, pelas escolas das elites inglesas onde o tempo de duração das aulas era cinquenta minutos. Quarenta e cinco minutos de jogo e cinco para preparação, com dois tempos para dar revanche ou desempatar. Como as turmas eram formadas por vinte alunos, dez de cada lado. E o goleiro? Bem, lembram da figura do bedel? Aquele carinha chato que era uma espécie de inspetor responsável pela disciplina de cada turma? Pois é, durante o inverno, quando o esporte tinha também a finalidade aquecer os meninos ricos ingleses, era impraticável colocar um deles paradão entre as traves, congelando, então colocaram o bedel. O bedel era, afinal, apenas um empregado, podia ficar com frio e tornou-se o décimo primeiro homem em campo.
Assim, turmas de 20 alunos definiram a quantidade de jogadores e duração de 50 minutos de aula estabeleceram o tempo de cada metade do jogo, nada misterioso ou cabalístico como alguns podem pensar. Nada a ver com o tamanho do campo, pois este variava muito na época até que, finalmente, foi regulamentado pela FIFA em terreno de 90 a 120 metros de comprimento e de 45 a 90 metros de largura, mas para partidas internacionais a entidade recomenda as seguintes medidas: entre 100 e 110 metros de comprimento, e entre 64 e 75 metros de largura.
O que vale é que o João Saldanha era uma autoridade em futebol, senão como jogador ou técnico, pelo menos como historiador e estudioso. Esta é uma homenagem a esse gaúcho carioca que respirava o esporte mais popular do Planeta e a ele dedicou sua vida, e que morreu como queria, depois de comentar a copa faleceu em Roma em 12 de julho de 1990. JAIR, Floripa, 15/06/10.

sábado, 12 de junho de 2010

O Beijo.


Foto e escultura "O Beijo".

Em San Diego, um belo passeio cultural que se pode fazer é visitar o Museu Porta-aviões Midway, atracado na baia da cidade. A enorme belonave transformada em museu foi construída em 1960 e recebeu o nome de Midway em homenagem a famosa batalha de junho de 1942. Visitei o super organizado museu, mas não é esse o assunto do texto.
Nos entornos da baia de San Diego há uma atmosfera militar que nos remete à guerra, a armas, batalhas e afins. Assim, ao lado do Midway há uma escultura de oito metros de altura de um marinheiro beijando uma enfermeira, e é sobre isso que quero falar.
No final da Segunda Guerra Mundial, quando foi anunciada a rendição do Japão, e o povo americano em euforia comemorava a vitória nas ruas, o fotógrafo Alfred Eisenstaedt fez uma foto, que se tornou famosa, de um marinheiro beijando uma jovem enfermeira na Times Square de Nova York. "O Beijo", como ficou conhecida a foto, retrata o instante no qual a enfermeira Edith Shain de 26 anos era beijada por um marinheiro que, empolgado, distribuia beijos a todas as moças naquele momento. Curiosamente, nunca se soube a identidade do marinheiro, já a enfermeira esteve no mesmo local em 2005 para inauguração da estátua “O Beijo” e contou que havia dado um tapa no rosto do ousado marujo.
Em 2005, quando o artista J. Seward Johnson foi convidado a participar na exposição anual de esculturas de grande escala exibidos ao longo do Bayfront em Sarasota, na Flórida, ele decidiu recriar a foto numa escultura de 26 pés de altura. Essa obra, reproduzida em várias cidades americanas, encontra-se numa praça ao lado do Midway e é uma atração que ninguém deve perder.
Evoco a escultura e a simbologia que ela representa neste dia em homenagem a todos os namorados, namoradas e românticos de todo mundo. JAIR, Floripa, 12/06/10.

A fama da calçada


Na Calçada


Com franqueza, não se enquadra no meu perfil; não é o tipo de roteiro cultural que eu faria espontaneamente; nunca imaginei, nunca mesmo, ir a Los Angeles e, muito menos, visitar o caminho das famosidades, a tão decantada Calçada da Fama. Situada ao longo das ruas Hollywood Boulevard e Vine Street no bairro de Hollywood, Califórnia, EUA, onde o chão é constituído por mais de duas mil lajes com estrelas, onde estão gravados nomes de celebridades honradas pela Câmara do Comércio de Hollywood pelas suas contribuições para a indústria do entretenimento.

Bem de acordo com o espírito comercial de tudo que se faz em Hollywood, os homenageados na calçada são atores, atrizes, diretores e produtores, músicos, dramaturgos, cantores, escritores, roteiristas, coreógrafos e que tais, os quais trazem ou trouxeram alguma arrecadação para a cidade em função de suas atividades artísticas.

Como a atração é muito conhecida no Planeta todo, milhares de pessoas chegam a LA literalmente TODOS os dias para conhecer a calçada, tirar fotos do marco HOLLYWOOD pespegado no morro e conhecer Beverly Hills, bairro elegantérrimo onde moram os astros.

Pois é, como nem sempre mandamos no nosso destino, ainda mais quando se trata de turismo, acabei indo parar em Irajá, ou melhor, em LA em um curto passeio de menos de um dia.

Na mesma Hollywood Boulevard encontra-se o não menos conhecido Teatro Chinês que é onde a cerimônia de entrega do Oscar se realiza. Na frente desse teatro de arquitetura original, suntuosa e exagerada, encontra-se o pedaço de calçada onde as celebridades imprimem baixos relevos de seus pés e mãos no cimento fresco. Ao lado, o não menos conhecido e apreciado Museu de Madame Tussaud, onde os famosos estão reproduzidos em cera, com uma espetacular técnica de modo a representá-los, não só com aparência natural, mas numa atitude como se estivessem congelados um momento trivial de suas vidas cotidianas ou profissionais, nada de poses estudadas. As estátuas de cera são tão convincentes que é justo classificá-las como clones perfeitos das pessoas. Assim, John Wayne, Marilyn Monroe, Humphrey Bogart e James Dean, dividem espaço com Barack Obama, JFK e Bin Laden, numa mistureba eclética e interessante, vale a pena visitar o museu.

Como corolário, toda a frente do teatro e do museu é tomada por atores amadores – aqueles que vão a LA em busca de um lugar à sombra – fantasiados dos mais variados personagens de filmes, desde Cinderela, Shrek e Mikey Mouse até Edward Mãos de tesoura e Avatar. O perverso dessa “operação cinema” é que os atores fantasiados cobram – em geral cinco dólares – para serem fotografados. Os desavisados turistas, ao apontarem suas câmeras com o fito de registrarem o passeio, são forçados a posarem ao lado dos personagens e obrigados a pagar pela foto. Milhares de dólares por hora fluem dos bolsos dos visitantes para as mãos dos fantasiados. Calcula-se que cada um daqueles achacadores morde algo em torno de cem mil dólares, não declarados, ou mais por ano. É uma soma considerável, mesmo para os padrões de uma cidade cara como LA.

Então, lá estamos nós os brasileiros embasbacados, não pela calçada, mas sim pelo fluxo ininterrupto de turistas embasbacados pisando o solo sagrado onde os U$ são o Deu$ $upremo; onde mitos como Michael Jackson levantam do túmulo tantas vezes por dia quantas necessárias para fazer o “plim” na máquina registradora; onde um simples nome gravado no cimento é mais valorizado que um quilo de ouro; onde fama e dinheiro são sócios e fundem-se numa amálgama indiscernível que obnubila as mentes mais lúcidas dos passantes, os quais, literalmente, obnubilam o chão que, afinal, é apenas um piso sem maiores atrativos, contém apenas nomes gravados. Lá estávamos, quando recebi o insight: Na verdade, o que atrai os visitantes para cá não é a Calçada da Fama, e sim a fama da calçada, nada mais. JAIR, Floripa, 02/06/10.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

O Cassino


Meu crachá

Nos USA, em geral, as leis estaduais se sobrepõem às federais se a matéria não for constitucional, o que, aliás, é muito frequente, visto que a Constituição se compõe de apenas sete artigos e vinte e quatro emendas.

Essa “liberalidade” legislativa se deve, evidentemente, à forma confederada de Estado adotada, nada anormal. Comparando, aqui no Patropi, nossa formação federativa de Estado determina a submissão legislativa absoluta dos estados à Constituição e às leis menores, não se podem contrariar matérias federais quaisquer que sejam.

Então, lá no irmão do norte, como a Constituição é omissa com relação a jogos de azar e, segundo o princípio que tudo que não é proibido é permitido, os estados legislam ao sabor das vontades dos eleitores matérias referentes a cassinos e apostas de modo geral. Há estados que proíbem jogos e há estados que os permitem, na Califórnia os cassinos são legais, mas só em “Reservas Indígenas”.

Opa! Reservas Indígenas? Sim, caros leitores, Reservas Indígenas, mais do que espaços físicos áridos onde se confinam os americanos naturais, são “pessoas jurídicas” de direito público onde constam índios como integrantes de uma comissão, uma espécie de clube cuja diretoria é constituída de Navajos, Seminoles, Sioux, Moicanos, Dakotas etc. As Reservas gozam de certa autonomia administrativa e funcionam como se fossem “Zonas Francas”. Essa flexibilidade conceitual do que é uma Reserva Indígena permite que se construa um cassino em plena Downtown, sem contrariar a legislação, desde que o local pertença aos índios por aquisição.

Dentro do princípio legal e consoante à liberdade individual dos que querem jogar, e de acordo com o apetite de arrecadação do estado, existem pencas de cassinos na Califórnia. A economia de San Diego, não está submetida à exploração de cassinos como Las Vegas, mas lá existe uma meia dúzia deles.

Assim, o turista que vos escreve não poderia deixar de conhecer uma casa onde se explora a jogatina sob o falso pretexto de diversão. Fomos a um. Mas como funciona realmente um cassino? Lá no Sycuan Cassino, como na maioria das casas de jogos, você, o potencial jogador, o cara que vai deixar o dinheiro nas máquinas e nas mesas, tem que ser seduzido, conquistado, tem que sentir-se confortável e até paparicado se for o caso. Você será alvo de todas as atenções, se assim o desejar.

Para seu conforto, ao adentrar o ambiente, você tem duas opções. A primeira é ser um jogador anônimo que perde ou ganha e não precisa ter contato com nenhum funcionário da casa, joga a dinheiro e, se ganhar, as máquinas e as mesas fornecem um “vale” automático que lhe dá direito de trocar por dólares em caixas eletrônicas próprias para isso ali mesmo nas salas de jogos. Se perder, ninguém fica sabendo, o anonimato é respeitado. A outra opção é identificar-se e receber um crachá de “sócio” que lhe dá direito a certas regalias. Agora como “sócio” você tem direito a uma refeição, independente da hora. Não um lanchinho qualquer ou um tira-gosto, mas uma lauta refeição tipo self service, com dezenas de pratos quentes e frios, sobremesas, refrigerantes e sucos ao gosto do freguês e sem hora para terminar, significa que você pode passar o tempo quiser comendo sem ser incomodado.

Vejamos o jogo propriamente, por ser “sócio” você não é obrigado a jogar, mas se o fizer, poderá colocar o crachá no lugar apropriado da máquina e esta registrará quanto você jogou, quanto ganhou ou perdeu e vai somando pontos à sua conta, de modo que ao atingir certa cota você terá direito a nova refeição, a qualquer dia de sua existência. Essa “liberalidade” visa estimular seu retorno.

Quanto ao ambiente físico da casa, cabem algumas observações. Os imensos salões estão sempre abarrotados de máquinas e mesas, em qualquer direção que se vá, seja ao banheiro, ao bar ou à sala de estar as tentações estão presentes, não há como “desligar-se” da atmosfera de luzes e sons convidativos ao jogo e que estimulam o estado de vigília, não há como sentir sono. Nas máquinas se pode jogar a partir de um cent, é uma atrativa maneira de induzir os pobres ao jogo. O ar condicionado é perfeito, não há qualquer variação seja inverno ou verão, dia ou noite. Por falar em dia e noite, não há janelas, não há como se ter referências externas, fica-se confinado num agradável ambiente acarpetado onde inexistem relógios ou meios que permitam “sentir” o exterior.

Contam-se histórias de jogadores compulsórios que passam dias jogando, apenas comendo e bebendo, sem dormir. Pelos exageros que custaram saúde, fortunas e, às vezes vidas, o povo da Califórnia exigiu, e o poder público acolheu, agora não são permitidas caixas eletrônicas de bancos dentro dos cassinos, se você quer jogar leve seu dinheiro em cash, nada de cartões de crédito.

Pois é, antes de entrar no Sycuan, estabeleci que ia jogar no máximo vinte dólares, perdi dezesseis, me diverti muito e saboreei uma deliciosa refeição, minha mulher jogou três dólares e ganhou sessenta e dois. Custo-benefício positivo, mas voltar, talvez daqui a três anos, não é a minha praia. JAIR, Floripa, 09/06/10.


domingo, 6 de junho de 2010

México


Pagando mico em Tijuana

Dia primeiro de maio de 2010, passou a vigir resolução diplomática que deixa de exigir visto de brasileiros que queiram entrar no território mexicano, e tenham visto americano. Aliás, decisão inteligente, já que a exigência que se fazia de visto para aquele país era, justamente, para evitar que brasileiros atravessassem a fronteira mexicana com destino aos EUA. Se o indivíduo tem permissão para entrar nos EUA ou já está em seu território seria necedade proibi-lo de entrar no quintal do vizinho, não é mesmo?

Então, em seis de maio fomos, eu e minha mulher, a San Diego, Califórnia, ali pertinho do México, tão perto que parte da Califórnia e do Novo México, estados americanos, já foram territórios mexicanos.

Em 1853, depois de uma guerra cruenta, de 1846 a 1848 entre os EUA e o México, foi completada a anexação de territórios do México iniciada com a incorporação do Texas, motivo da guerra. Metade do território mexicano havia sido perdida para os Estados Unidos, (Remember Alamo!). Lázaro Cárdenas, presidente mexicano (1934-1940), comentou em relação ao imperialismo norte-americano: "Pobre México, tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos"

Essa frase reflete o sentimento à época em que o México tinha perdido grandes porções do seu território para os EUA, por isso a alusão à proximidade com aquela nação, e a referência a Deus deve-se a fase de rebeliões com muitos crimes, muita insegurança que ocorria no México àquela época.

A frase tornou-se famosa e é evocada pelos mexicanos sempre que querem fazer alusão ao abismo econômico e social que separa os dois países de extensa fronteira comum. Fronteira que menos impede e mais estimula a migração de mexicanos em busca de uma vida supostamente melhor.

Então, estávamos ali em San Diego, onde existe um trolley elétrico que vai até às portas de Tijuana por apenas cinco dólares, e as restrições já não existiam, por que não ir? Fomos. Minha expectativa era que o México real de fronteira não fosse aquele estereótipo que vemos em filmes americanos: Ruas sujas e mal ajambradas com lojas humildes, operadas por gente feia e meio desonesta, vendendo tacos e tequila a turistas e tentando enganar os fregueses “ricos” como são todos os americanos. Minha esperança era que o México de fronteira fosse mais como Guadalajara, cidade bonita e organizada onde estive na década de noventa.

Bem, chegando ao fim da linha do trolley, adentramos o México por uma passarela toda fechada como se um túnel fosse. E daí a surpresa, ou falta dela se quisermos. Tijuana lembra exatamente aquele retrato feio que os americanos pintam, nada tem a ver com Guadalajara. Ruas ruins e gente esquisita querendo “assaltar” no bom sentido (às vezes no outro sentido também), os turistas. Dezenas de farmácias, umas coladas nas outras, com atendentes implorando para que você adquira remédios que necessitam de receitas nos EUA e aqui não.

Curiosidade, na rua principal de Tijuana, calle Ignacio Zaragoza, nos dois lados, em todas as esquinas, existe “zebras” vivas nas calçadas, sobre as quais o passante pode montar e tirar fotos a preço de dois dólares cada. Zebras? É possível isso? Na verdade, uma bizarria, burros brancos pintados com listras pretas à moda de zebras. Por incrível que pareça, vi turistas japoneses portando sombreros, montados nos bichos, tirando fotos. Não consigo imaginar como os japas vão justificar lá em casa tal excentricidade. Passei ao largo, eu hein!

Tijuana, guardadas as diferenças culturais, lembra Cidade de Leste no Paraguai junto à divisa com Brasil. Pergunto-me, não serão todas as cidades de fronteiras parecidas? Considerando que, segundo a ONU, os indicativos econômicos e sociais do México são muito melhores que os do Brasil, é de se supor que exista uma “síndrome de fronteira” (border effect, chique né!) que remete as cidades ali situadas a uma vala comum de dependência econômica do turismo e certa atmosfera de coisa não muito honesta, um ar meio conspiratório.

Explico, estávamos numa loja comprando lembran-cinhas, atendidos pelo dono muito simpático e falante. Fiz um teste: Perguntei-lhe como adentrar os EUA, e ele me indicou a direção da migração, a umas duas quadras adiante. Fiz cara de quem flatulou (existe verbo flatular?) na igreja e, baixando a voz, menti que não tinha visa, como fazer então? No mesmo instante o cidadão respondeu com voz normal, “esto no es posible!” e, baixando a voz e olhando para os lados assim como se procurasse algo ou alguém, acrescentou “acá no, pero...”. Em outra loja indaguei pela Marijuana, com jeito inocente de quem não sabe o que está falando. Imediatamente o clima conspiratório se estabeleceu. Interessante, não?

Bem, não quero rotular um país por apenas umas poucas impressões que tive, isso não é justo. Tento apenas entender porque as coisas são assim. O México é um ótimo país, me diverti muito e lá paguei um alentado mico que poderia ser monumental se tivesse montado nas tais “zebras”. Vale a pena conhecê-lo. JAIR, Floripa, 06/06/10.



quinta-feira, 3 de junho de 2010

O ROBÔ


Capek e Asimov


Tenho um robô modelo Robosapien V2 ao qual dei o nome de “Asimov”, acompanhado de seu fiel cãozinho “Capek” modelo Robopet, ambos adquiridos nos USA em 2006, mas de fabricação chinesa como quase tudo hoje em dia.

Segundo a história robótica, o escritor tcheco Karel Capek usou a palavra Robot pela primeira vez em 1921, mas quem a imortalizou, por assim dizer, foi Isaac Asimov (1920 – 1992), ubérrimo cientista e escritor que criou as melhores estórias de robôs que se conhece.

Muito mais que escrever estórias de robôs, Asimov criou um mundo onde essas máquinas e os homens interagiam e evoluíam juntos, mas, para que isso fosse possível, havia necessidade de regras que definissem essa convivência sem conflitos, ou com um mínimo de atritos. Então ele criou as três conhecidas leis da robótica que vigem até hoje em qualquer relação homem-robô: “1ª lei: Um robô não pode ferir um ser humano ou, por omissão, permitir que um ser humano sofra algum mal; 2ª lei: Um robô deve obedecer as ordens que lhe sejam dadas por seres humanos, exceto nos casos em que tais ordens contrariem a Primeira Lei; 3ª lei: Um robô deve proteger sua própria existência desde que tal proteção não entre em conflito com a Primeira e Segunda Leis”. O que quase ninguém sabe é que essas leis derivam da lei zero: “Um robô não pode fazer mal à humanidade e nem, por inação, permitir que ela sofra algum mal”.

Pois bem, o “Asimov” e seu cãozinho “Capek” estão devidamente programados para obedecer a três leis e não apresentam qualquer perigo, em consequência posso usá-los sem causar danos às pessoas.

“Asimov” é uma máquina muito complexa que possui oitenta funções. Ele tem três sensores de infravermelho, uma câmera sensível a cores primárias, sensores estereofônicos nos ouvidos, sensores de toque nas mãos e pés, pesa seis quilos e tem 56 centímetros de altura, é articulado nas juntas dos membros, na cintura e pescoço.

Vejamos o que diz o fabricante: “Robosapien V2 é uma fusão robótica altamente evoluída de tecnologia e de personalidade, combinando movimentos biomecânicos com reações multi-sensoriais e personalidade interativa humanóide. Com 56 centímetros de altura, a segunda geração Robosapien é capaz de autonomia tipo “free roam”, ou comportamento livre, e é capaz de múltiplos níveis de interação com o ambiente, com os seres humanos e objetos”.

Movimenta-se para frente e para trás, desvia de obstáculos, fala, canta, arrota, peida (e pede desculpas), dança, reage voltando-se para a origem dos sons, pega objetos no chão e os oferece ao dono, levanta-se quando deitado. No modo automático demonstra uma série de habilidades culminando com uma dança, ao término da qual diz estar envergonhado, não se sente bem dançando. A comando ri, ruge, insulta, dorme, acorda e, mais interessante, interage com o cãozinho, nota a presença dele (a meio metro de distância) e comanda o cão. O bichinho reage abanando o rabo, latindo, sentando, deitando e seguindo o Robosapien se este desloca-se.

Sinceramente, estou muito satisfeito com meus amigos robôs, eles são como animais de estimação, só que não comem nem bebem, não necessitam de cuidados médicos, nem “banho e tosa”, nem fazem sujeira, e, mais importante, têm um botão de desligar, de modo que “descansam” quando EU quero. Sempre estou no comando.

Agora pode surgir a pergunta: “O que faz um adulto, aparentemente equilibrado, adquirir um brinquedo de criança?” Não sei, mas uma resposta possível pode incluir uma infância em que robôs eram apenas coisas que apareciam em estórias de FC, e não objetos reais, tangíveis e manipuláveis. Outra pode ser curiosidade científica. Não sei.

O fato é que não estou sozinho nessa de “brincar como criança”, que o digam os que curtem trenzinhos de brinquedo, quase sempre são “adultos equilibrados”, quase nunca, crianças. JAIR, Floripa, 03/06/10.

terça-feira, 1 de junho de 2010

O GUIA DA VIDA

O GUIA DA VIDA

A ideia não é minha, o texto eu o desenvolvi a partir da sugestão de James Lovelock, autor da Teoria de Gaia. Suspeito que o título também não seja original; que já exista livro assim denominado, contudo, é a proposta para consecução de obra que nos ensine a viver; a olhar o mundo o qual nos rodeia e compreendê-lo nos seus fundamentos; a ter noção exata sobre o ambiente que nos cerca. O projeto terá a função de restaurar os múltiplos aspectos e condições de uma civilização que poderá ser extinta nos próximos séculos, por incúria nossa ou por algum fenômeno natural inescapável e mortal.

Partindo do pressuposto que a civilização poderá estar a caminho de sua derrocada em função da exaustão dos meios que Gaia nos oferece para a sobrevivência, e os quais não usamos judiciosamente, é estultice ignorar a possibilidade de desastre.

Considerando que a civilização venha a sucumbir, mas que haja sobreviventes, um manual de como reconstruir a sociedade sem repetir os erros que já cometemos, torna-se quase compulsório. Seria um guia prático para nossos descendentes com os registros precisos, escritos em linguagem descomplicada, de todo o caminho que percorremos até aqui com relação ao meio ambiente, com instruções de como viver em harmonia com ele. É claro que, um guia desses não iluminaria para frente; não descortinaria o futuro, mas, voltado para nosso passado, resumiria o que fizemos para chegar ao presente. Qualquer pessoa inteligente entenderia como chegamos aqui e deduziria o que fazer para não cometer os mesmos erros.

Um manual desses não existe. Procuremos em qualquer biblioteca do mundo um guia que explique com clareza a condição atual da civilização e como ela chegou até ao presente, e nada encontraremos. Todos os livros que existem não tratam da maneira como a sociedade pode encarar uma possível ruína.

A ciência nos proporcionou uma vida tão confortável e segura que ignoramos os caminhos que ela percorreu e as pequenas (e grandes também) conquistas que criaram a civilização.

Imaginemos os sobreviventes de uma civilização fracassada tentando enfrentar um simples surto de infecção bacteriana qualquer. Sem o conhecimento que temos desses organismos essas pessoas poderiam sucumbir.

Seria um livro de divulgação do conhecimento, bem escrito, agradável de ler, cuja qualidade do texto permitiria uma leitura como passatempo. Abrangeria desde coisas simples como instruções para acender uma fogueira, construção de um abrigo na selva, planejamento de uma horta básica até a descrição do sistema solar e a intimidade da matéria. Seria um tratado filosófico, antropológico e de ciência o qual forneceria uma visão ampla e genérica do Planeta e da vida que nele existe. Explicaria os mecanismos da evolução, da seleção natural, noções básicas de medicina incluindo o funcionamento dos sistemas, das células e dos órgãos. Falaria sobre os microorganismos nocivos e os meios de combatê-los. Seria muito mais que um manual de sobrevivência, seria um guia de conduta e esclarecimento. Explicaria as leis básicas da física, da química, da meteorologia e dos fenômenos naturais como terremotos e vulcões. Publicaria a tabela periódica dos elementos onde incluiria as principais qualidades e utilidades dos metais, substâncias e ligas conseguidas através deles. Explicaria as propriedades do ar, das rochas, das águas; esclareceria a importância das florestas, dos rios e dos mares. Por último, informaria o conteúdo da “Arca de Noé Genética” da Noruega, mostraria maneiras de se chegar até lá e como utilizar as sementes conservadas naquele abrigo. Numa analogia natural diríamos: um livro que mostraria onde está o peixe ao invés de fornecer o pescado.

Um livro escrito em todas as línguas mais usuais, que ajudaria a trazer a ciência para dentro dos lares e escolas, bem como a todo lugar que o Homo sapiens viesse a ocupar depois de um cataclismo.

A apresentação de tal compêndio seria no velho e tradicional papel, é ocioso imaginá-lo em meios eletrônicos supondo que o fim da civilização acarretaria o fim desses meios também. Nele, os sobreviventes não encontrariam informações para construir uma catedral ou uma nave espacial, mas, certamente, como domesticar uma planta ou fabricar artefatos de cerâmica, sim. O que se imagina é um livro escrito em papel de boa qualidade e durável; claro, conciso, imparcial, atualizado e exato. E, acima de tudo, devemos acreditar que, numa nova sociedade que surgisse, um guia dessa natureza seria necessário, e, até mais que isso, essencial. JAIR, Floripa, 01/06/10.