sábado, 31 de março de 2012

Sandices meteorológicas



Meteorologia, taí um assunto que ocupa a mente do homem desde sempre e que, em tempos atuais, ocupa a memória dos mais potentes super computadores já construídos por esse mesmo homem. É razoável supor que os fenômenos climáticos foram os primeiros eventos a impressionar os primitivos bípedes falantes. Chuva, vento, neve, granizo, raios, nuvens, estações do ano e todas as manifestações associadas ao tempo não só marcavam presença nas tribos primevas, como determinavam o ritmo de suas vidas. Também há entre os paleontólogos, antropólogos e outros estudiosos da pré história consenso que o fogo, descoberto por volta de duzentos mil anos atrás, segundo algumas evidências de restos de fogueiras encontradas, foi observado primeiro em algum tronco que ardia devido incidência de raio, daí a história da civilização começou.
No dia-a-dia das comunidades primitivas tudo que devia ser feito rolava em função do tempo, não o cronológico, mas o tempo meteorológico. Se chovia limitava os deslocamentos, geralmente esfriava e forçava o homem a procurar abrigo. Aliás, deve ter sido decorrência das chuvas e das nevadas a construção da primeira oca, ou a procura da primeira caverna. O frio, sem qualquer dúvida, conduziu nossos ancestrais à confecção das primeiras vestimentas, fossem de pele de animais ou de fibras vegetais. O vento, com o ainda hoje fazem caçadores do Calahari na África, tinha que ser considerado durante as caçadas, sua direção era importante tanto para sentir o cheiro da caça como para impedir que o animal visado sentisse o odor do caçador. Povos que viviam às margens de rios e lagos se serviam desse discípulo de Éolo para impulsionar seus barcos.
Mas, parece que mais importante que os fenômenos menos previsíveis e mais “imediatos” como sol e chuva e dia e noite, seriam as estações do ano. Mesmo que os Homo não tivessem a noção exata de quando uma estação começava e outra havia terminado, eles – principalmente na fase de caçadores-coletores – tinham que sintonizar suas andanças em busca de alimento com as mudanças de clima ao longo ano, ainda que não existisse o ano formal calendárico a que estamos acostumados. Se era tempo de certa fruta em tal lugar, ou se animais passíveis de serem caçados se deslocavam em tal estação para tal área, era fundamental que eles soubessem dessas mudanças sob o risco de passarem fome e, quem sabe, até esta ou aquela comunidade que não fez o deslocamento certo e a tempo, se extinguir. A meteorologia era o maestro que regia os movimentos humanos.
Bem, estou me referindo ao passado pré histórico, mas nos dias de hoje qual é a importância do clima para a civilização? Essa é fácil: importância fundamental. Mesmo porque, ao longo do desenvolvimento de nossas culturas, o clima no sentido mais amplo, e o tempo localizado no sentido mais restrito, deram as cartas para que formulássemos praticamente todas as atividades que desenvolvemos. Podemos citar como exemplo as atividades ao ar livre que deixam de ser realizadas quando chove. Quem não ouviu algo mais ou menos nesses termos: “O desfile de sete de setembro será realizado na avenida tal se não chover”. Ou algo mais drástico, do tipo: “A aeronave Discovery teve seu lançamento adiado por causa da ameaça de furacão na costa da Flórida nos próximos três dias”. Ou alguma coisa bem mais permanente como: “Os edifícios altos construídos na costa leste americana são projetados para suportar ventos de até duzentos quilômetros horários sob risco de serem destruídos por furacões que abundam na região”. Até o Japão, depois do tsunami acontecido em 2011, está planejando reconstruir suas áreas sujeitas a esse fenômeno com conceitos inovadores que evitem a maioria dos danos causados pelas paredes de água que adentram a terra. Como se trata de japoneses dá para acreditar em quase tudo que se diga com respeito a tecnologias, até em casas que se elevem sobre pilastras super potentes à aproximação das ondas gigantes invadindo a terra firme. Coisa de louco!
Fora essas considerações naturais e extremamente importantes, existem ainda outras que determinaram a ocupação territorial do Planeta, e que deram feição à civilização como a conhecemos. Por exemplo, os primeiros primitivos que atravessaram o estreito de Bering da Ásia para as Américas e resolveram, talvez por cansaço ou preguiça, guinar para o norte mesmo, não puderam desenvolver tecnologias sofisticadas porque na região só existe gelo e neve, o que não permite nem o desenvolvimento de árvores, daí os inuit – que algumas pessoas chamam de esquimós – só poderem construir abrigos de gelo cortado (iglus) ou de peles de animais estendidas sobre ossos de baleia a título de caibros e vigas, coisa frágil e de pouca duração devido aos ventos. Enquanto povos que se fixaram em locais com muitos recursos naturais decorrentes da bonança do clima, construíram civilizações sólidas não só em edificações perenes, como também em saberes que deixaram como legado para a posteridade. O tão polêmico calendário maia está aí para corroborar o que digo.
Pois então, fica patente que o bicho homem está à mercê do tempo, mas isso não significa que ele não se opõe às condições impostas pelo clima, sempre que estas lhe sejam muito desfavoráveis ou dificultem sua lidas. Além disso, “involuntariamente” a humanidade está influindo de maneira decisiva no comportamento meteorológico em consequência de suas atividades. Consumo de combustíveis fósseis libera gases que tem efeitos desconhecidos, mas preocupantes, sobre a camada de ozônio e formação de nuvens, cujo albedo é de suma importância para controlar o aquecimento atmosférico como resultado da radiação solar.
Em alguns momentos, os cientistas tomam a si a incumbência de controlar o clima sem muito sucesso, diga-se a bem da verdade, borrifando nuvens com solução alcalinas ou nitrato de prata. Ou com sucesso relativo construindo represas que formam lagos em zonas áridas com a finalidade de aumentar a umidade e provocar chuvas. Um exemplo doméstico é a formação do lago Paranoá em Brasília, o qual tem, entre outras, a finalidade de umedecer o micro clima do planalto em que cidade se situa. Nos EUA, o lago Mead, formado pela represa Hoover sobre o rio Colorado tem tripla finalidade: melhorar o clima do deserto de Nevada, canalizar água para plantações e ser usado como fonte de água potável para cidades situadas no deserto como Las Vegas.
O clima, por fim, é tão complexo e tão importante que, como eu disse no primeiro parágrafo, foram construídos super computadores só para entendê-lo e, se possível, domesticá-lo. Mas, parece, querer transformar a meteorologia em ciência exata, é mais um sonho de uma noite de verão que uma realidade viável por enquanto. JAIR, Floripa, 18/02/12
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quarta-feira, 28 de março de 2012

Sandices aviatórias

A história da aviação é bastante polêmica quando se trata de dizer quem foi o primeiro a construir e voar numa aeronave “mais pesado que o ar”. Para nós brasileiros não há dúvida que o franco tupiniquim Alberto Santos Dumont foi o precursor da façanha, tendo voado 1906 numa geringonça chamada 14 Bis, construída por ele mesmo em Paris. Para os americanos, os irmãos Orwille e Wilbur Wright voaram em 1903, embora eles não tenham registro fotográfico ou impresso sobre o feito, enquanto o voo de Santos Dumont foi amplamente registrado em filmes e na imprensa. Como dizem os bicheiros, “vale o escrito”; ou como os órgãos da justiça determinam: O que não está nos autos não existe. Então para nós, e para todo o sempre, o nosso ASD foi o pioneiro e pronto, quem não estiver satisfeito que mude a história.
Além desse embate por hegemonia aviatória no continente americano, há outras estórias da carochinha que, vez ou outra, aparecem em algum artigo jornalístico ou em livros por aí. Parece que todo mundo foi pioneiro da aviação. Os russos, que não costumam “perder” para ninguém, também tem lá um inventor que em 1889 teria feito um arriscado voo em uma máquina de fundo de quintal e teria morrido no experimento. Na França, o crédito é dado a Clément Ader que teria feito o primeiro voo em uma aeronave impulsionada por motor a explosão e levantando voo pelos seus próprios meios em 9 de Outubro de 1890. Gustave Whitehead disse ter voado em uma aeronave mais pesada do que o ar, por meios próprios, em 14 de agosto de 1901. Esse “Gustavo Cabeça Branca” falhou em documentar seu voo, mas posteriormente, uma réplica de seu Number 21 conseguiu alçar voo com sucesso, indicando tratar-se de uma máquina tecnicamente viável. Lyman Gilmore, outro inventor ousado, também afirmou ter voado em 15 de maio de 1902, embora, como muitos outros, nada pôde provar.
Na Nova Zelândia, o fazendeiro e inventor Richard Pearse construiu um monoplano que alçara voo em 31 de março de 1903. Existem fortes evidências que esta decolagem de fato ocorreu, entre testemunho e fotografias. Porém, o próprio Pearse, num rasgo de honestidade, admitiu que foi um voo não controlado e que havia terminado por chocar-se em um morro após ter voado a um teto de três metros. Karl Jatho voou em uma aeronave mais pesada do que o ar em agosto de 1903. Seu voo foi de curta duração, porém, e a velocidade da aeronave e o desenho da asa fizeram com que o avião não fosse bem controlável pelo piloto, ou seja, a traquitana não poderia ser considerada um avião sob qualquer ângulo. Ainda em 1903, testemunhas dizem ter visto o escocês Preston Watson fazer seus voos iniciais em Errol, no leste da Escócia. Porém, a falta de quaisquer evidências fotográficas ou documentárias faz com que este voo pareça mais outro conto da carochinha.
O engenheiro romeno Traian Vuia também diz ter voado em um avião, e que ele decolou e sustentou voo por tempo razoável, e sem a ajuda de ventos opostos. Vuia teria pilotado a geringonça que ele desenhou e construiu, em 18 de março de 1906, em Montesson, perto de Paris. Contudo, ainda que paire dúvidas se eles existiram de fato, nenhum de seus voos superou 30 metros de distância. Para efeito de comparação, no final de 1904, os irmãos Wright, dizem os americanos, já teriam realizado voos de 39 quilômetros de distância e de 39 minutos de duração.
Muitas reivindicações de voo são estranhas pelo fato de que vários destes deslocamentos alcançaram tão pouca altura, que fizeram os aviões confundirem-se com o solo e não ficou patente se eles estavam voando ou quicando no chão. O pejorativamente chamado “voo de galinha”. Além disso, são controversos também os meios utilizados para alçar voo. Alguns decolaram supostamente por meios próprios, enquanto outros foram inicialmente catapultados para decolagem, e, no ar, continuavam a sustentar voo por meios próprios. Só que “meios próprios” também são controversos nestes casos citados, porque ao atirar uma pedra com estilingue ela “voa” até o impulso inicial se extinguir em consequência do atrito com o ar e ela cair por força da gravidade. Então cadê os meios próprios? Eu diria que a maioria dessas máquinas de fundo de quintal se semelhava a grandes pipas meio desengonçadas que conseguiam se sustentar enquanto impulso houvesse e os ventos lhes fossem favoráveis, algo muito longe de uma aeronave autônoma.
Essa plêiade de arrojados pioneiros estabeleceu um nascimento tão tumultuado que, aparentemente, não se via um futuro definível à frente. Então, é surpreendente que a aviação tenha se desenvolvido até isso que vemos hoje. Imensas aeronaves incorporando o que há de mais avançado no campo de ligas e compostos leves e materiais resistentes às altas temperaturas, à fadiga e ao desgaste; a última geração do mais avançados equipamentos eletrônicos e computadores que praticamente pilotam e navegam sozinhos, de tal modo que a intervenção humana é quase totalmente dispensável; comunicação e localização geográfica global por meio de satélites com precisão de centímetros em certos casos; motores com potência, desempenho e economia de combustível inimagináveis até no sonho mais louco dos pioneiros; desenho aerodinâmico que permitem velocidades até três vezes maiores que a do som; capacidade de carga útil ou de passageiros seguramente de até centenas de vezes maiores que as primeiras aeronaves; e uma proliferação planetal de modo que virtualmente todos os cantos da Terra, habitados ou não, estão ao alcance dessas máquinas com o maior conforto. Isso tudo, além de ser uma arma de guerra formidável, para vergonha dos homens de paz.
Num artigo sobre os avanços da aviação, o cientista Otto Fitzmayer fazendo uma alusão aos níveis tecnológicos que as aeronaves incorporaram desde seu surgimento no século passado, disse: “Se os automóveis tivessem incorporado tecnologias e inovações no mesmo nível que as aeronaves o fizeram estariam hoje fazendo 200 quilômetros por litro, andando normalmente a trezentos por hora e teriam autonomia de trinta mil quilômetros”. É isso aí, o meio de transporte aéreo, além de tudo, só não é mais seguro que elevadores. JAIR, Floripa, 18/02/12.

segunda-feira, 26 de março de 2012

Sandices planetais



Obviamente o chamado sistema solar, composto pela estrela de quinta grandeza, Sol, circundado por bolotas denominadas Planetas, é conhecido e incontestado até por pessoas comuns, de modo geral não há nada de excepcional nele que possa gerar polêmica. Contudo, poucos de nós temos uma noção mais acurada de seu funcionamento. Um ponto de partida conveniente para estudar outros corpos celestes, principalmente planetas, é nosso planetinha azul, por razões óbvias. Enquanto não houver viagens interplanetárias, os astrônomos não têm como recolher amostras da superfície ou da atmosfera de outros corpos celestes, ou registrar as vibrações que se processam no interior de suas massas. Podem apenas, certamente frustrados, olhar sem tocar, ficam dependentes de dados conduzidos através do espaço por ondas de luz ou de rádio – informações o mais das vezes vagas e enganosas. E devem, acima de tudo, admitir que os planetas estudados são iguais ou muito parecidos com o nosso. Por exemplo, todos os corpos celestes se atraem mutuamente pela gravidade, então por que uns não “caem” sobre os outros? Por que a Lua não cai sobre a Terra? Ou: Por que todos os planetas são aparentemente esféricos, ou quase isso? Por que não existem planetas quadrados?
A rigor, a resposta porque os corpos celestes não caem uns sobre os outros e porque são redondos é a mesma: por causa da gravidade. Então vamos aos fatos. Newton não descobriu a gravidade observando a queda de uma maçã nem sendo atingido por ela conforme reza a lenda popular. As observações relativas à gravidade e à queda dos corpos haviam sido amplamente estudadas, mas se aplicavam somente à superfície da Terra, pois não havia como extrapolá-las para o desconhecido espaço cósmico. Não se fazia ideia da gravitação como força universal, afetando todos os objetos, inclusive corpos celestes. Parecia óbvio que a gravidade não podia ser aplicada a corpos que flutuavam no éter, porque eles não caíam sobre a Terra. Newton usou sua genialidade para incluir a Lua nas suas leis da gravitação e dizer por que ela não caía.
Observou por experiência que um objeto atirado horizontalmente segue trajetória tanto menos curva quanto maior for sua velocidade. Essa experiência é fácil de reproduzir, basta observarmos que um tiro dado na horizontal tem maior alcance se tiver maior velocidade. O tempo que bala leva para cair no chão é o mesmo que se nós a soltarmos livremente da mesma altura. No programa “MythBusters”, Caçadores de Mitos em português, os cientistas apresentadores provaram de forma cabal que isso é verdade. A gravidade atua com a mesma força (9,81m/s²) tanto no projétil disparado pela arma, quando no largado livremente, de modo que ambos caem no mesmo tempo. Pois bem, o jovem Isaac raciocinou que a elevada velocidade da Lua, algo em torno de 3700 quilômetros por hora, fosse suficiente para fazê-la seguir sua conhecida trajetória, a despeito da tendência a cair, como se comportam todos os objetos. E levando um pouco mais adiante seu raciocínio, baseando-se nas propriedades matemáticas das elipses de Kepler, admitiu que, quando aumenta a distância da Terra, a força da gravidade diminui proporcional ao quadrado da distância. Foi uma sacada genial!
O carinha (Newton) não foi exatamente feliz ao aplicar tal ideia à Lua, mas, quando conseguiu melhorar a estimativa do tamanho da Terra, sua matemática provou que ele estava certo. Na verdade a Lua se movia com a exata velocidade para que a gravidade da Terra, atenuada pela distância, a mantivesse em órbita, sem fazê-la cair na superfície e tampouco perder-se no infinito do cosmo. Essa sacada de Newton foi um dos maiores feitos na história do pensamento humano. Fizera uso da conhecida força que faz as coisas caírem sobre a Terra, para explicar porque a Lua não caía. Não é à toa que seu trabalho lhe valeu o grau de “Sir” concedido pela rainha da Inglaterra.
Já sobre a forma arredondada ou redonda da Terra, e, em consequência de todos os outros astros também, assim me expressei em outra ocasião: “A forma arredondada do planeta se deve à gravidade, essa força atua sobre toda a superfície igualmente de forma que a esfera é a forma geométrica que melhor distribui a massa que está sob o efeito da gravidade. E o achatamento se deve a gravidade do sol e da lua que “puxam” a massa terrestre nos trópicos e pela força centrífuga gerada pela rotação, que tenta expelir a massa na região do equador onde o momento angular é maior”.
Mas Sir Newton havia tirado o gênio da garrafa, a estrutura do sistema solar começou a adquirir a forma como a conhecemos, livre daquela baboseira de esferas concêntricas, órbitas do Sol em torno da Terra e quetais. Todos os integrantes do sistema se moviam conforme leis universais da gravitação, cuja ação pode ser reproduzida numa só frase: “Os corpos se atraem com uma força que varia diretamente com produto de suas massas e inversamente com o quadrado da distância entre eles”. Agora, por que a lei de Newton funciona, não se sabe. O que se pode afirmar com segurança é que o Universo é feito de tal forma que a lei de Newton fornece um resumo excelente dos movimentos observados.
Portanto, o sistema solar e todo o universo conhecido estão em movimento constante regulado pela lei da gravitação universal, então não há porque perguntarmos por que a Lua não cai, ou porque os planetas não são quadrados, são esferas. Esferas perfeitas não, o nome correto é esferóide oblato que, em linguagem de gente, quer dizer uma esfera ligeiramente achatada.
Assim, neste cantinho da Via Láctea, neste sistema que deve ser replicação de milhares de outros existentes no Universo, os planetas quase esféricos giram em tono de um a estrela sempre do mesmo jeitão, por cauda da lei enunciada por Newton, nada muito estranho ou minimamente polêmico. E planetas outros que existirem em outros sistemas, em outras galáxias, certamente estarão obedecendo as mesmas regras dos nossos, isso podem ter certeza, não pode existir regras diferentes para o mesmo fenômeno. JAIR, Floripa, 06/03/12.

sábado, 24 de março de 2012

Sandices físicas



A história das ciências tem um tripé no qual se apóia: física, química e biologia. Ainda que sem a física e a química não existiria biologia, por questão de metodologia, qualquer ciência quando estudada nos seus efeitos e constituição aplicados à vida, se denomina biologia. Já química e física são ciências de origem separada embora convirjam em certas situações. Nada sei de química a não ser aquelas noções de química orgânica e tabela periódica que nos ensinam no nível intermediário da escola. Já, pela minha formação em mecânica, a física me acompanhou durante toda a vida profissional e por dever de ofício me envolvi mais com suas sutilezas.
Obviamente este não é espaço apropriado para falar sobre fórmulas, questionar conceitos ou desenvolver raciocínios sobre física. O que desejo é dar um passeio dirigido em função de certas “verdades” que para nós, pessoas comuns, não costumam ser visíveis e claras. Por exemplo, quem realmente consegue entender um conceito de mecânica quântica, essa teoria que afirma que as coisas podem ser e não ser ao mesmo tempo? Em minha opinião, existem três tipos de pessoas: as que nunca ouviram falar de mecânica quântica; as que ouviram falar e não sabem como funciona; e as que fingem que sabem. Um cientista envolvido com essa matéria declarou que existem só cinco ou seis pessoas no Planeta que entendem de mecânica quântica, o resto só chuta. Eu concordo com ele.
Outra questão que queima milhões de neurônios dos gênios envolvidos em remover óbices da física é a teoria do campo unificado que, trocando em miúdos, é um tipo de teoria que permite que todas as forças fundamentais entre partículas elementares sejam descritas em termos de um único campo. Pra começar temos que entender que existem quatro forças fundamentais na natureza: gravidade, força nuclear fraca, força nuclear forte e eletromagnetismo. A gravidade é a força de atração que permeia absolutamente todos os corpos do universo. Esta força une a matéria, é responsável pelo peso das coisas, por maçãs caírem na sua cabeça, por manter a Lua na órbita da Terra, os planetas confinados à volta do Sol, e por agrupar galáxias em grande aglomerados. A força nuclear fraca por ser tão fraca é quase só imaginada, mas é responsável pela coesão das partículas subatômicas, isto é, ela mantém os nêutrons coesos. Se houver o chamado declínio radioativo, essa força que já é fraca torna-se mais fraca ainda e o nêutron divide-se espontaneamente num próton, um elétron e um anti-neutrino. A força nuclear forte mantém nêutrons e prótons unidos para formar o núcleo dos átomos, sem ele não haveria átomos nem matéria alguma, não haveria Universo. Por último, o eletromagnetismo que é força de repulsão ou atração dependendo do sinal menos ou mais que o determine. Esta força pode ser atrativa ou repulsiva. Cargas elétricas com o mesmo sinal (duas positivas ou duas negativas) repelem-se; com sinais diferentes atraem-se. A força eletromagnética segura os elétrons (cargas negativas) nas suas orbitais, à volta do núcleo (carga positiva) do átomo. Esta força permite a existência dos átomos.
Pois bem, uma teoria do campo unificado não existe. Desde que Einstein formulou suas teorias da relatividade geral e especial, monstros pensantes de todo o Planeta se puseram a procurar uma teoria que unisse essas quatro forças conhecidas num só conceito e numa fórmula matemática única que explicasse essa união. Acho que se gastou mais fosfato nessa busca, que tempo na busca do Santo Graal, na descoberta da Pedra Filosofal ou dinheiro e pesquisa na cura da calvície. Para complicar mais um pouco essa procura os cientistas descobriram que as Galáxias, as quais estão se afastando umas das outras, se afastam em velocidade cada vez maior, estão acelerando. Pela força da gravidade elas deveriam compulsoriamente estar diminuindo a velocidade de afastamento e não aumentando. Então, os mais potentes cérebros da astronomia deduziram que existe uma força escura que contraria a gravidade. Entornou o caldo! Se quatro forças já eram difíceis de administrar, imagine cinco. Sendo que dessa quinta nada se sabe de concreto, só existem conjeturas.
Então ficamos assim, quanto mais questionamos a física, mais ela nos apresenta mistérios a serem solucionados e menos respostas. Por que, enfim, estou tentando dar esses toques em algo que ninguém conseguiu solucionar até agora? Simples. A conclusão é que todos passaram a ter direito a “chutar” respostas estultas desde que os eruditos pesquisadores não conseguiram. Pois então aqui vai meu palpite: não existem quatro, cinco, dez ou treze forças elementares, existe apenas uma que se manifesta em vários níveis.
Já se provou que matéria (massa) e energia são manifestações diferentes de uma mesma coisa, ou seja, a matéria pode ser transformada em energia (bomba atômica, por exemplo) e a energia pode ser transformada em matéria. De forma que muita matéria equivale a muita energia. Por que não considerarmos então que um mínimo de matéria (nêutron) possui um mínimo de força – força nuclear fraca – e que um montão de matéria (galáxias) contém um mundo de força – gravidade? Portanto não é questão de qualidade ou tipo de força, mas apenas de intensidade. Em grandes massas a força se manifesta com grande intensidade, em massas menores ela é proporcionalmente pequena. Óbvio ululante, para usar uma expressão nelsonrodrigueana.
O senhor René G. Martin de 81 anos, pai do André Martin que prestigia este blogue com seus inteligentes comentários, está desenvolvendo uma teoria a qual será publicada em breve, que explicará a mecânica universal com uma simplicidade exasperante para aqueles que se dedicam há anos na busca de respostas. Não quero aqui desvendar nada sobre a teoria, porque não desejo diminuir a surpresa nem me adiantar ao mestre que a desenvolve, mas tenho certeza que ele não contraria minha “teoria do campo unificado”. Penso que estamos de acordo nos pontos fundamentais que unificam as forças, nos demais nossas divergências são apenas capilares e perfeitamente contornáveis.Assim, a questão a resolver fica bem simples se os cientistas esquecerem essa multiplicidade de forças e lembrarem que, sejam quantas forem as manifestações, só existe uma força. JAIR, Floripa, 03/03/12.

quinta-feira, 22 de março de 2012

Histórias edificantes

Era uma vez, abaixo da linha do equador, um país fictício medíocre, mal ajambrado e sem futuro, onde supostamente todos eram iguais perante a lei. Essa igualdade estava capitulada na constituição no seu artigo quinto: “Art. 5º. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos naturais e aos estrangeiros residentes no país a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, etc”.
O contraditório das normas que vigem nesse país imaginário, é que há o pressuposto que todos devem conhecer as leis e obedecê-las, contudo, no momento em que a justiça deve cobrar o respeito, a obediência e o acato às normas legais, pesos e medidas diferentes são aplicados a cada caso.
Assim, se um garoto rico, num momento de lazer, por barbeiragem e uso indevido de uma moto aquática atropelasse um menina pobre que estivesse brincando na areia da praia e a matasse, por exemplo, o inquérito revelaria que o menor em questão era inimputável e dispensado de qualquer sanção porque não fora autorizado por nenhum maior responsável para utilizar o veículo. Mesmo que tenha fugido de helicóptero do local do acidente sem prestar socorro à vítima. O inquérito seria arquivado e os pais da vítima não teriam nem direito a um pedido de desculpa dado pelos pais do causador da morte. Aliás, o inquérito nem sequer ouviria testemunhas que viram um adulto colocando o aparelho na água e viram o garoto, com um colega na garupa, dar cavalos de pau em áreas destinadas aos banhistas e proibidas a práticas náuticas. E o garoto não tinha habilitação.
Digamos que o filho de um dos homens mais ricos do país, dirigindo um automóvel de dois milhões de reais atropelasse um ciclista no acostamento. Esse indigitado rapaz, mesmo tendo várias multas – desprezadas e não pagas - por excesso de velocidade, exibiria em uma rede social os ferimentos causados pela imprudência do ciclista e insinuaria que o morto era responsável por seus (do motorista) prejuízos materiais e emocionais. Neste caso, como o homem pobre não estava presente para se defender, valeria a palavra do motorista rico e este só não pediria indenização aos familiares do ciclista morto porque era “humano” demais para fazer isso. E o delegado que preside o inquérito declararia que o morto foi imprudente, insinuando que foi bem feito para ele, na próxima que preste mais atenção no trânsito.
Nesse mesmo país, garotos de classe média alta da capital que colocassem fogo em um pobre índio que dormia num banco de praça não seriam apenados, pelo contrário, um deles que era filho de um juiz, ganharia um cargo público em uma repartição da capital. Cargo que ele sequer precisa comparecer para ganhar o equivalente a vinte salários mínimos, desses que trabalhadores comuns labutam de sol a sol, seis dias por semana para ganhar, e que não dá nem para alimentar uma pessoa.
Se, por exemplo, um médico famoso na área de fertilidade fosse acusado por mais de cinquenta mulheres por violação sexual enquanto sedadas para procedimento cirúrgico, e as acusações fossem comprovadas a ponto de se instaurar inquérito, não seria nada surpreendente se esse mesmo médico rico e freqüentador de colunas sociais não fosse impedido pela justiça de tirar passaporte com o visível intuito de sair do país antes de uma possível condenação. Seria até imaginável que a Polícia Federal lhe tenha negado o passaporte, mas um juiz tenha concedido liminar no sentido de facultar-lhe esse “direito” constitucional e ele tenha se mandado para o Líbano o qual não possui acordo de extradição com esse país hipotético. Dezenas de pacientes desse médico estariam amargando suas humilhações e conduzindo seus traumas decorrentes dessas violações.
Num estado do sul dessa terra inventada, se um deputado rico, bêbado de juntar criança, num carro importado, correndo a mais de duzentos por hora atropela e mata dois rapazes que esperavam, dentro do carro, o semáforo abrir. O atropelador, não indeniza as vítimas, não é apenado pela lei e nem sequer tem a carteira de habilitação suspensa.
Bandidos que se tornem muito ricos depois de fraudarem o INSS ou na construção de um Tribunal de Contas, não recebem sanções compatíveis com o crime e nem precisam se preocupar em devolver um níquel do dinheiro roubado. Suas posições de milionários lhes isentam de punições e devoluções, mesmo que o dinheiro que lhes tornou assim tenha fins escusos. Nesse suposto país existe até uma tal Lei do Colarinho Branco que, em tese, deveria ser aplicada a corruptos e corruptores de alta linhagem, mas essa lei é apenas letra morta, jamais foi usada.
Nesse mesmo país, as prisões estão cheias de gente que foi amaldiçoada com a letra “P”. Pobres, pretos e prostitutas abarrotam as instituições penais. Ricos e influentes desconhecem o que é perder a liberdade. Dinheiro e notoriedade são diferenciais que comandam a “justiça” nesse paizinho. Mas, lembremos que a justiça é cega, surda e muda. A justiça é cega, não vê o crime, mas olha com interesse a conta bancária do acusado. A justiça é surda, não ouve o morto, mas presta atenção nas palavras daquele que sobreviveu se este tiver dinheiro. A justiça é muda, não condena o rico, mas insinua que o pobre sempre é o culpado. Como é um país inventado, não tem nome, mas se me fosse dado o poder de nomeá-lo eu, indignado, o chamaria de Patropi. JAIR, Floripa, 21/03/12.

terça-feira, 20 de março de 2012

Anéis de Saturno

Embora as sondas espaciais Voyager 1 e 2, que sobrevoaram os planetas em novembro de 1980 e em agosto de 1981 tenham constatado a existência de anéis que circundam Júpiter e Urano, desde sempre, são os anéis de Saturno que chamam mais atenção dos astrônomos e fazem a imaginação das pessoas comuns criar asas. Aliás, os anéis de Júpiter e Urano são tão transparentes, tão espectrais que só com instrumentos especiais podem ser detectados, já os de Saturno, com um pequeno telescópio de espelho de oito polegadas é possível bisbilhotá-los.
Na verdade, os anéis desse planeta são mais conhecidos que a atmosfera e outras características suas. Durante os primórdios da astronomia telescópica conjeturou-se muito se os anéis eram contínuos ou constituídos de vários corpos separados e as ilustrações da época registram como se fossem apenas três. A dúvida foi sanada quando, através de radios telescópios, mediram-se as velocidades das bordas interna e externa dos anéis. Se os anéis fossem contínuos, girariam em torno do planeta como rodas, e suas bordas externas teriam maior velocidade que as internas, como acontece com uma roda de carro, por exemplo. Mas observou-se que ocorre ao contrário, a borda interna, mais próxima de Saturno, gira mais depressa que a externa. Como se deve esperar de corpos separados, os corpos mais próximos do astro o qual circundam devem mover-se mais rápido para vencer uma gravidade maior. Lei da gravitação universal de Newton: “Os corpos se atraem com uma força que varia diretamente com produto de suas massas e inversamente com o quadrado da distância entre eles”. Portanto, cada “faixa” de anel gira com a velocidade que um satélite giraria naquela distância.
Essa descoberta provou que os anéis são constituídos por corpos independentes e órbitas e velocidades próprias; mas não permitiu concluir qual seu tamanho nem de que material são feitos. Mas a medida que Saturno gira em torno do Sol na sua órbita de vinte e nove anos, os anéis parecem mudar lentamente de posição.Quando olhados de perfil, os anéis somem totalmente, indicando que são extremamente finos. Fora esses famosos corpos, Saturno ainda possui cinquenta e três satélites conhecidos e batizados, mas, suspeita-se que existem pelo menos nove outros ainda não batizados.
Em 2004, a sonda Cassini-Huygens alcança Saturno. Transformando-se no primeiro veículo espacial a orbitar aquele planeta distante e em aproximar-se de seus anéis. A missão foi programada para concluir no final do ano 2009 quando a Cassini ficou sem energia e perdeu-se no espaço. A sonda clicou e transmitiu para a Terra, as primeiras fotos em “close” do planeta e seus anéis. Na verdade, close é apenas uma expressão, porque no momento em que as imagens foram feitas, a câmera da sonda estava a uma distância de quase mil quilômetros, na verdade precisamente 998,045 quilômetros do planeta. Ao contrário do que se supunha, os anéis são milhares, uns próximos dos outros, mas longe o suficiente para não colidirem. Numa comparação grosseira, pode-se dizer que os anéis semelham-se a um disco LP, daqueles bolachões de 33 rotações em desuso atualmente.
O cuidadoso estudo da luz do Sol refletida nos anéis leva à conclusão que são feitos de partículas desde não maiores do que grãos de areia até o tamanho de um ovo da gansa, mas de superfície áspera, como se esta fosse recoberta de cristais microscópios de gelo. Pelas fotos e pela reflexão de ondas de rádio, concluiu-se que os anéis não têm mais que alguns centímetros de espessura, e que as partículas que o formam não representam mais que cinco por cento do volume dos mesmos. Ou seja, os anéis são noventa e cinco por cento espaço vazio, coisa impressionante.
Já, a origem desses diáfanos, mas impressionantes, anéis ainda está no campo das conjeturas, ou dos chutes se preferirem. Entre os astrônomos há uma linha que cogita ver neles restos de matéria que jamais chegou a aglomerar-se e formar um corpo sólido, um satélite. Outros acham que são restos de algum corpo – cometa, satélite ou asteróide – que se desintegrou ao passar de “raspão” por Saturno, sendo que os detritos resultantes entraram em órbita em torno do equador do planeta. Em qualquer os casos os anéis são alguma coisa resultante de outra diferente.
Contudo, qualquer que seja a formação e qualquer que seja a origem desses anéis, uma coisa é certa: são espetaculares e conferem uma identidade própria a Saturno. E, sobretudo, dado que podem ser “restos” que marcam uma tragédia anterior, quase compulsoriamente, nos remetem à lembrança o inverso do adágio famoso: Os dedos se foram, mas os anéis permanecem. JAIR, Floripa, 10/03/12.

domingo, 18 de março de 2012

Sandices botânicas



As leguminosas estendem suas ansiosas gavinhas espiraladas lateralmente com a visível intenção de alcançar incautos vizinhos. Que haveriam de pensar tais plantas com esse gesto? Resposta rápida e tosca: NADA. Plantas não pensam, aliás, nem cérebro tem. Talvez aí resida a origem de suas atitudes estranhas: pelo fato de não possuírem cérebros, não lhes é possível entender que não podem agir com consciência. Então agem, talvez programadas geneticamente para assim procederem, não em decorrência de “decisão” consciente.
No campo mais amplo das florestas, lojisticamentre (de loja, não de logística) falando, a preocupação é mais vis-à-vis, isto é, árvores de porte não estão nem aí para leguminosas e suas gavinhas, elas não querem é ser abatidas para o comércio de suas carnes, as quais os lenhadores e afins costumam chamar de madeira. Pelo fato de lhes faltarem pernas para se distanciarem do machado que as machuca – embora o sândalo, num ato inexplicável, perfume esse instrumento de morte – elas são vítimas contumazes do Homo ignorantus que se autodenomina sapiens, o qual ceifa as maiores, mais robustas e de tronco mais retilíneo para uso em suas construções e malfeitorias madeirais.
Árvores e outros vegetais não têm crenças, não se guiam por supostos saberes religiosos que estabelecem vida depois da morte, mas intuem que existem infernos como o Saara e o Atacama e céu como Amazônia. Sabem por instinto que grandes civilizações botânicas floresceram onde hoje se encontra esses enormes desertos, sabem que densas florestas adornaram regiões que hoje só se vê areia, pedras e camelos. Sonham que algum dia o verdejar de suas folhas ressurjam nos recônditos áridos do Planeta. Sonham que um dia poderão viver em pleno consórcio com animais e minerais sem interferência de homens, que estes certamente já estarão servindo de insumo para suas raízes, pois assim é a ordem estabelecida pela natureza: mortos servem de alimento aos vivos.
Mirtáceas, nonáceas e monocotiledôneas e um amplo espectro de vegetais se unem num só frêmito incontido no intuito de fazerem-se notar na orquestra não fônica do mundo verde. Tais ações estão em completo acordo com o instinto de sobrevivência que é o sentimento comum de todos os seres carboníferos, vale dizer, replicadores e que nascem, crescem e morrem. Nenhuma sandice se os denominarmos de seres vivos. Da sequóia majestática ao humilde alface verde pálido, passando por miríades de árvores, arbustos, gramíneas e cactos o universo vegetativo traduz o que há de mais passivo e vilipendiado nos reinos da natureza. Vegetais sofrem a ação dos animais. Vegetais não lhes podem causar danos por ação direta, mas têm suas armas, se não secretas, pelo menos nem sempre ostensivas, como seus espinhos que são mais incômodos que fatais.
Os venenos produzidos por certas plantas são as armas com menor ou maior potencial de letalidade que elas possuem. Assim, curare e cicuta são duas das mais conhecidas de potentes peçonhas fabricadas pelas plantas, mas existem muito outras mais. Talvez o homem não se dê conta, mas cafeína, substância de baixo potencial peçonhístico, é um dos venenos mais usados pelo Homo desde muito tempo. THC (tetra-hidro-canabinol) veneno contido nas folhas, talos, flores e sementes da Cannabis sativa está associado ao uso de gente que deseja um estado alterado de consciência, mas também cura dores crônicas e tracoma, a chamada maconha é um santo remédio.
À parte essa faceta, digamos pernóstica dos vegetais, existe o lado sem o qual a vida animal no Planeta seria inviável. Plantas nutrem-se dos elementos químicos que retiram do solo, da água e do ar, transformam esses elementos em substâncias mais complexas que servem para nutrir os animais, ou seja, vegetais atuam como laboratórios de transformação cujos produtos finais são o alimento que permitem os animais viverem. Então, dentro da cadeia alimentar os vegetais “intermediam” insumos entre a natureza bruta e o aparelho digestivo requintado dos demais seres. Plantas são repassadoras de energia, em outras palavras. Mas, o que ganham as plantas ao cederem alimentos aos animais? Simples, quando os animais morrem suas substâncias complexas voltam ao estado primitivo através da degradação (putrefação) e os elementos resultantes servem de alimento (adubo) para os vegetais, o ciclo se fecha finalmente.
Ainda existe outro fascinante exemplo de utilidade para as plantas. Chama-se dendrocronologia que é o nome da ciência que se vale do crescimento irregular das árvores para determinar a idade de coisas e eventos. Por exemplo, podemos usar um relógio de anéis de árvores para datar um pedaço de madeira que foi usado na construção de uma casa pioneira, nos primeiros povoamentos efetuados pelos colonizadores portugueses, com precisão de poucos anos. Assim como a existência dos anéis indica crescimento anual, também existem anos piores e melhores, pois as manifestações climáticas variam de ano para ano. O El - ninho, erupções vulcânicas de monta como a do Pinatubo em 1991, invernos rigorosos ou verões muito quentes, fazem com que o crescimento retarde ou acelere. Anos bons, do ponto de vista da árvore, produzem anéis mais robustos que anos ruins. É o padrão de anéis largos e estreitos em uma dada região, causado por uma sequência específica de bons e maus anos, que se tornam uma marca registrada, - uma espécie de impressão digital que rotula os anos exatos que os anéis se formaram. Assim, esses “relógios arbóreos” contribuem para datação da história do sobre a terra e são instrumento extremamente útil e preciso até onze mil anos atrás.
Pois é, tirante a passividade vegetativa do mundo botânico que não permite que ele se defenda dos seus predadores, às plantas nada falta se lhes estiverem disponíveis solos úberes de elementos nutritivos, água de boa qualidade, luz abundante e atmosfera não muito poluída. Os vegetais, via de regra são pouco exigentes e conseguem viver e se reproduzir quase em quaisquer climas, altitudes e meio ambiente deste Planeta, exceção a desertos muito quentes e calotas polares. Se um dia o bicho homem, na sua infinita sabedoria conseguir destruir-se e à maioria dos seres existentes no Planeta, provavelmente sobrará apenas tiririca, digna representante do reino botânico. JAIR, Floripa, 25/01/12.

quinta-feira, 15 de março de 2012

Sandices insetais



Se ignoramos os seres microscópicos como bactérias e vírus, podemos afirmar com segurança que a forma de vida que mais deu certo e que mais abunda no planetinha azul, são os insetos. Esses bichos de seis pernas, com exoesqueletos, divididos em cabeça, tórax e abdômen, a maior parte das vezes com asas, são resultado do caminho evolutivo mais bem sucedido que se conhece. Antes que alguém pergunte, aranhas não são insetos, têm oito pernas, dividem-se em encefalotórax e abdômen, são artrópodes e parentes dos escorpiões e dos caranguejos. Registros fósseis nos provam que insetos habitam o Planeta há bilhões de anos e não há qualquer indício que deixarão de existir algum dia.
Pois bem, o bicho homem, este animal não tão bem sucedido como os insetos, mas arrogante de doer, o mais das vezes ao avistar um bichinho destes, tende a matá-lo. Parece que insetos são objeto de repulsa, nojo, medo ou desprezo, nenhum sentimento altruísta ou bondoso, embora abelhas e bichos-da-seda sejam animais que prestam serviços relevantes a humanidade desde que a civilização começou.
Os insetos ocupam todos os continentes, inclusive a Antártida, e todos os ambientes, desde o lodo de rios e lagos, até milhares de metros acima do solo, passando por montanhas geladas, florestas e desertos inóspitos. O bichos são perseverantes, versáteis e resistentes, o Planeta é deles, nós somos apenas inquilinos malcriados e danosos que ao invés de pagar aluguel detonamos o ambiente no qual vivemos.
A natureza no seu caminho evolutivo sempre fez experiências no sentido de explorar todas as possibilidades de formas, meios de locomoção, tamanhos, tipo de reprodução, alimentos, adaptabilidade ao meio, longevidade, força e toda uma complexa gama de diferenças entre suas diversas criações. Assim, o número de pernas, por exemplo, varia desde seres sem pernas até o milípede que, ao contrário do que o nome sugere, pode ter um pouco mais de cem pares de patas. Os mamíferos, aves e répteis têm nenhuma (baleias e golfinhos) duas ou quatro pernas, os peixes nenhuma, mas os insetos têm seis. Então, será que seis pernas é uma boa solução?
Então, cientistas da NASA envolvidos numa pesquisa visando construir um meio de transporte adequado à exploração em outros planetas, descobriram que um veículo com maiores possibilidades de locomover-se bem em terreno desconhecido, mas certamente irregular e hostil, seria um carro com seis rodas ou seis pernas. O Mars Rover é resultado dessa conclusão. Porque será hein? Simples, lembremos aquela definição de geometria: “três pontos não alinhados no espaço estão SEMPRE no mesmo plano”. Ai vem uma observação dos entomólogos (estudiosos dos insetos): ao deslocar-se, em qualquer momento, o inseto sempre estará apoiado em três pernas. Portanto, o inseto sempre estará estável qualquer que seja a superfície na qual ele se apóie. É só lembrar que suportes para instrumentos ou objetos de precisão que devem atuar ao ar livre usam tripés: máquinas fotográficas e teodolitos, por exemplo. Não é de estranhar, portanto, que insetos sejam tão bem sucedidos na corrida evolutiva, eles “descobriram” o número ideal de patas que os tornam estáveis e possivelmente vencedores dessa corrida que ainda está em pleno agito. No futuro vencerão os mamíferos que desenvolverem seis pés, quem viver verá.
Então, além dessa magnífica solução para locomover-se a pé, os insetos ainda possuem asas na sua maioria. Vejamos a libélula. Esse magnífico inseto de quatro asas transparentes e esverdeadas que vive voejando sobre córregos e pequenos lagos é um predador formidável de outros insetos, girinos e alevinos, quem diria! Na fase larval, o inseto vive dentro da água onde come girinos e alevinos, logo que se transforma em adulto voa sobre os cursos de água e ataca outros insetos. Pois é, além de voar ele tem uma vida subaquática como um submarino armado e predador, coisa de filme tipo “Oitavo passageiro”, aliás, a forma daquele monstrengo alienígena criado para o filme foi baseada nos insetos.
Insetos de todo mundo, esses bichinhos em geral vegetarianos, também se encontram na base da cadeia alimentar. Eles servem de alimento a outros insetos, aves, répteis, mamíferos e até ao homem. No oriente é comum gafanhotos, grilos e cigarras serem degustados como iguarias de gosto exótico e prenhes de proteínas. No nordeste brasileiro as tanajuras fazem parte de um cardápio exótico, sendo iguaria em mercados públicos como o de São José, em Recife. Tanajuras são fêmeas férteis das formigas saúvas, aquelas mesmas que “acabam com o Brasil se o Brasil não acabar com elas” como disse Saint-Hilaire, botânico, naturalista e viajante francês, que aqui esteve em 1816.
Em 2009 publiquei um texto muito bom sobre insetos chamado, “Coleópteros”, onde desmistifiquei a lenda que esses bichinhos são responsáveis pelas perdas nas lavouras, me expressei assim: “Assim, nos acostumamos associar esses bichos com danos que eventualmente eles nos causam e os temos na conta de inimigos públicos, para dizer o menos. Entretanto, essa idéia de perversidade ligada ao inseto não se traduz em números, das 350 mil espécies conhecidas de coleópteros, apenas algumas dezenas, efetivamente, ocupam-se em atacar os cultivares desenvolvidos para alimentação humana, a esmagadora maioria é inocente, ou seja, trata-se de insetos inofensivos que só estão preocupados com a reprodução, alimentação e modus vivendi lá deles, sem atinar que na superfície do planeta em que vivem, existe um tal de Homo sapiens, seja lá o que isso for ou represente para sua própria existência”. Pois bem, esse é terceiro texto mais lido de meu blogue com 4.692 visualizações de página até hoje (04/03/12), só perdendo para “Iakuza” e “Cinema”.
Claro que não sou entomólogo, mas gosto imensamente de insetos, já escrevi além do texto citado, “Lepidópteros” cujo tema são as borboletas, então quero finalizar com este fecho que usei anteriormente com relação aos Coleópteros: “De todos os coleópteros o Vaga-lume talvez seja o mais exótico de todos. Bem, considerando esse multimilenar universo de seres tão pequenos quando hostilizados, podemos facilmente escolher os coleópteros como os representantes mais formidáveis do mundo dos insetos pela sua espantosa variedade, pela diversidade de suas aptidões e pela beleza de seus coloridos” JAIR, Floripa, 04/03/12.

terça-feira, 13 de março de 2012

Sandices felídeas



A prodigalidade da natureza, desde muitas centenas de milhões de anos, abriu um leque enorme onde distribui milhões de espécies animais. Dado as profundas e variadíssimas condições ambientais do planetinha azul é compulsório se esperar que uma multiplicidade de seres o habitassem. Assim, através de experimentações, a evolução das espécies foi cobrindo terras e mares com seres animais e vegetais que se adaptaram, através dos milênios, aos ambientes disponíveis. É bem verdade que nem todas as espécies que foram criadas sobreviveram, algumas extinções em massa (sete, no mínimo) foram observadas através dos fósseis que deixaram como prova.
A verdade é que o Planeta já passou por diversas extinções em massa, algumas de proporções megalodônticas, levando ao desaparecimento completo da maioria das espécies, e outras menores, nas quais foram extintos apenas alguns grupos de seres vivos. De qualquer forma, as extinções de grandes proporções marcam a mudança de um período a outro da história da Terra. Por exemplo, a extinção há 500 milhões de anos, chamada do Cambriano, marcou a passagem do período Cambriano para o Ordoviciano.
De certa forma, fica mais ou menos evidente que natureza “aproveita” as extinções - normalmente causadas por convulsões naturais, já que a Terra é um ser vivo – para renovar o plantel. O seja, depois de um grande cataclismo que provoque uma mortandade numerosa, os espaços vazios deixados pelos extintos, vão sendo ocupados por novas espécies que surgem e se desenvolvem. A natureza tem horror ao vácuo. Assim se deu depois que há 65 milhões de anos um asteróide do tamanho do Everest colidiu com a região onde hoje é o golfo mexicano e extinguiu os dinossauros, os quais viviam no Planeta há, pelo menos, 150 milhões de anos. Os bichos eram bem sucedidos evolucionariamente, mas, ao contrário dos crocodilianos que continuam existindo até hoje, não tiveram jogo de cintura para agüentar as mudanças climáticas surgidas em consequência do impacto. Foram para o brejo e deram chance para que os mamíferos que já existiam ocupassem os nichos deixados pelos bichos de sangue frio, o Homo, seja o sapiens ou qualquer uma das outras quatro espécies conhecidas, é produto dessa reengenharia. Porém, antes que alguém ache que essa foi a última extinção registrada, é bom que se diga, há dez mil anos os mamutes foram extintos, talvez com alguma ajudinha humana, mas, provavelmente, por mudanças climáticas de monta.
Então, extintos os dinossauros, os mamíferos puderam soltar a franga e se reproduzir em grande diversidade ocupando todos os cantos do Planeta. Não só os espaços físicos foram reorganizados, como a cadeia alimentar passou a ter nova dinâmica. Plantas eram alimentos de insetos, aves e mamíferos herbívoros, que serviam de alimento aos predadores carnívoros e aos carniceiros. Lembrando que carniceiros em geral não matam as presas, alimentam-se de restos de carcaças mortas por carnívoros ou acometidas de morte natural. Urubus e hienas são exemplos de carniceiros bem sucedidos dos tempos atuais, mas existem muitos outros. Como disse acima, a cadeia alimentar se reorganizou, daí espécies antes inexistentes passaram a ocupar o topo dessa cadeia. Os felinos foram as espécies que mais se destacaram nessa corrida ao pico do Everest, comem os de baixo e ninguém acima se alimenta deles.
Pois então, desde a extinção dos dinossauros, com os mamíferos praticamente dominando o meio campo; muitas espécies se destacando em seus ambientes, como os ursos no hemisfério norte e os grandes herbívoros na África, os felinos ocupando o alto do pódio alimentar, alguns desses animais estão entre os mais belos do Planeta. O felino é animal muito bonito antes de tudo. Mas, além disso, é forte, ágil, extremamente elegante, rápido, flexível e persistente. Existem felinos nas Américas, na África e na Eurásia, mas são inexistentes na Oceania, lá predominam os marsupiais.
Há registros históricos bem recentes – registros feitos pelo Império Romano – os quais dão conta que leões e tigres eram abundantes na Europa, Ásia e África. Hoje temos leões na África, tigres e leões na Ásia, mas a Europa está destituída deles graças à caça e ocupação e desmate de áreas em que viviam. Nas Américas temos linces no hemisfério norte, onças pintadas no hemisfério sul e puma, leão da montanha, suçuarana, onça parda ou cugar nos dois hemisférios. O puma é um felino tão bem sucedido – talvez melhor que qualquer outro - que ocupa espaços desde a fria Patagônia argentina até o frio estado de Oregon nos EUA, passando pelas florestas tropicais da América do Sul e da América Central e pelas montanhas rochosas do nosso irmão do norte. Talvez por isso seja conhecido por tantos nomes.
Mas, dentre todos os belos felinos do Planeta, os tantos que existem na África e até nossa belíssima onça pintada pantaneira, o mais espetacular é o guepardo, bicho parecido com o leopardo, porém mais esguio e com dois riscos verticais na cara como fossem lágrimas. Esse bicho de pelagem pintalgada é o animal terrestre mais rápido Planeta, chega a alcançar mais de 100 quilômetros por hora. Sua estratégia de caça consiste em avaliar a presa de longe e atacar correndo para alcançá-la. É um animal predador, preferindo uma estratégia simples: caçar as suas presas através de perseguições a alta velocidade, em vez de tácticas como a caça por emboscada ou em grupo, mas por vezes, pode caçar em dupla. Consegue atingir velocidades de 115 a 120 km/h, por curtos períodos de cada vez (ao fim de 400 metros de corrida), sendo o mais rápido de todos os animais terrestres, porém, em certa ocasião, avistou-se um guepardo que correu atrás de sua presa por 73 metros em 2 segundos, o que dá uma média de 130 quilômetros horários. Essa maravilhosa máquina de músculos é como um bólido esportivo, é o Lamborghini do reino animal.
Lembremos também que o gato doméstico, Felis catus, provavelmente descendente do Felis silvestri, é um felino como os demais, ou seja, primo dos leões, das jaguatiricas, das onças e até do formidável guepardo. As pessoas que gostam de gatos, na verdade apreciam a independência e a serenidade desses bichos, na natureza eles também são assim. JAIR, Floripa, 04/03/12.

sábado, 10 de março de 2012

Sandices lunares



Apesar de o homem ter chegado à lua seis vezes, quase nada sabe sobre ela, na verdade esse satélite é tão pouco conhecido como o fundo dos oceanos, por exemplo.
A terra é planeta pequeno, mas seu satélite de considerável tamanho lhe confere uma situação diferente dos demais planetas do sistema solar e até de planetas outros descobertos em estrelas distantes. Enquanto todos os demais planetas são enormes em relação a seus satélites, ou nem sequer os possuem, a terra e a lua são de tamanhos tão próximos que podem ser vistos como um planeta duplo. Em que pese um deles ser totalmente diferente do outro. Se pudéssemos observar a terra e a lua de um lugar distante como de marte, por exemplo, veríamos algo fascinante: um planeta pequeno acompanhado de outro maior, ambos coreografando uma dança um pouco estranha onde ora um deles está na frente, ora está atrás.
Não só para poetas e namorados, mas também para astrólogos a lua é um dos objetos mais atraentes do firmamento. O homem a tem estudado há séculos com telescópios, pousou na sua superfície e trouxe amostras solo e, mais recentemente, mede seus movimentos e distâncias através de espelhos lá deixados pelos astronautas, os quais refletem um feixe de laser lançado por observatórios dos EUA. Os primeiros homens que lá deixaram seus rastros viram-se num ambiente estranho e extremamente hostil. Um céu sempre negro. Lembremos que o azul do céu terrestre é uma consequência da atmosfera, mas a lua não tem esse luxo. A terra é sempre visível da lua e apresenta fases exatamente como esse satélite apresenta-se para nós. Mas a terra tem um diâmetro aparente quatro vezes maior, mas devido seu albedo ser muito maior que o da lua, reflete oitenta vezes mais, coisa de louco. Dá para ler jornal na noite selenita iluminada pela luz terral.
Não há clima, tal como o conhecemos na terra, na lua. Os diversos climas da terra dependem das mudanças de temperatura, dos movimentos dos oceanos e da atmosfera. A superfície da lua é seca e sem ar, mas as temperaturas na superfície têm variações brutais, para não dizer mortais. As áreas iluminadas pelo sol atingem temperaturas de mais de cem graus, e a longa noite lunar pode sofrer temperaturas de até – 185ºC. É por isso que as roupas dos astronautas são tão complexas. Seus macacões, além de serem uma couraça flexível que impede descompressão explosiva em caso de ser atingido por micrometeoritos, têm um isolamento térmico muitíssimo eficiente para suportar as tremendas variações de temperatura. Um macacão de astronauta não custa menos que dez milhões de dólares!
Assim como a noite lunar, as sombras são muito bem definidas e até perigosas. A menos que outra superfície iluminada reflita sobre elas, são completamente negras e os objetos abrigados nela tornam-se invisíveis. Se o astronauta mergulhar na sombra poderá tropeçar ou cair num buraco; se enfiar a mão na sombra sua mão desaparecerá completamente. Qualquer coisa deixada na sombra poderá congelar-se, pois as sombras são quase tão frias como a noite selenita.
O pouso das naves lunares se fez em áreas de nível baixo e relativamente plano, os responsáveis pelos lançamentos não podiam arriscar vidas e equipamentos caríssimos em pousos temerários. O terreno pouco acidentado mostrou uma paisagem extremamente monótona. O horizonte ficava muito próximo, então se tornou impossível ver as montanhas lunares. Devido ao seu tamanho, a curvatura da superfície da lua é tão acentuada que para um homem de estatura média o horizonte não vai além de três ou quatro quilômetros. Pela primeira vez os homens “sentiram” a redondês de um astro.
Sem atmosfera reconhecível para protegê-la, a lua fica exposta à violência alienígena. A radiação solar incide sobre ela com força impetuosa. Além disso, o satélite também é castigado pelo chamado “vento solar”, partículas carregadas eletricamente que nos dão as magníficas auroras boreais e austrais. Também micrometeoritos e partículas de poeira cósmica, conhecida como star dust atingem a lua sem piedade. Todos esses atacantes agridem a lua há bilhões de anos, ao passo que o planetinha azul é tão protegido por sua atmosfera e campo magnético que até poucos anos atrás não se suspeitava que esses fenômenos existissem.
Como ninguém pode perder todas, a lua é imune a outra espécie de fenômeno, a erosão. Sua superfície sem água e sem ar não está sujeita ao desgaste pelos movimentos das águas e pelo vento. Na terra vento, gelo e água elevaram as montanhas e escavaram os vales, além de, continuamente, mudarem a paisagem em todos os lugares. Pelo que se sabe a lua também não possui movimentos sísmicos, movimentos que enrugam a superfície do nosso planeta.
Em virtude dessa perenidade de suas paisagens, a lua possui gigantescas, e crateras de dimensões diversas, até do tamanho de um pires, que pontilham sua superfície por bilhões de anos. Os primeiros estudiosos da selenografia acreditavam que as crateras tinham origem vulcânica, mas essa suspeita se provou infundada, as marcas foram deixadas por colisões de objetos celestes. Desde pedrinhas minúsculas até meteoritos e cometas portentosos, todos deixaram sua marca na face da lua, e as marcas foram se acumulando por falta de erosão. “Cara de lua” tornou-se um apodo pejorativo para quem tem marcas no rosto deixadas pela acne.
Contudo, desde muito tempo se pensou que a lua era um corpo morto, mas em 1958 o astrônomo russo Kozyrev, xeretando a lua, tirava fotos da cratera Alphonsus, local que astrônomos americanos haviam assinalado como possível fonte de gases. Então, a três de novembro, notou que o pico estava avermelhado, quando antes era de cor neutra, indistinguível do resto da paisagem. A origem de tal coloração anômala ainda é desconhecida, mas conjetura-se a existência de uma pequena erupção vulcânica que, se confirmada, autenticaria a hipótese daqueles que acreditam que nosso satélite não está totalmente morto. Que dizer então de novas conjeturas que admitem existência de vida microbiana nas entranhas de planetas do sistema solar e até da lua? Depois que se descobriu vida nas fontes vulcânicas oceânicas existe gente querendo enxergá-la em todos os lugares, inclusive nos menos plausíveis. Não adiro e não enxoto para longe tais hipóteses, fico em cima do muro. JAIR, Floripa, 07/03/12
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quinta-feira, 8 de março de 2012

Sandices culturais




O bicho homem nunca se sentiu confortável sozinho, sem companhia ele tornava-se (torna-se ainda) sorumbático e vive menos e com menor qualidade. Seja porque indivíduos unidos representavam maior poder para caçar e sobreviver, ou seja porque a imperiosa força motora da reprodução impelia à união seres congêneres, o homem se tornou gregário em tempo integral. Portanto, desde os primórdios, nossos ancestrais formaram tribos, clãs, aldeias, vilarejos e por fim cidades. Essas aglomerações foram e são a marca registrada da humanidade, o instinto gregário moldou a civilização como a conhecemos.
Em decorrência imperativa da vida em comunidades o homem primitivo agregou a seu dia-a-dia, rituais, novos procedimentos, conhecimentos, objetos, normas e relações que deram feição àquilo que se convencionou chamar de cultura. Por conseguinte, cultura humana é esse conjunto complexo e intrincado, quase macarrônico, que todos os cidadãos do Planeta estão imersos e que permeia cada gesto ou ato que cometemos desde o nascimento até o último estertor e, ainda assim, os rituais de sepultamento, cremação ou outros meios de conservar ou se livrar do corpo também fazem parte da cultura que criamos e da qual fazemos parte. A cultura nos acolhe, nos mastiga, nos engole e nos vomita, nada podemos contra e nem razão temos para que assim deixe de ser.
Certamente a cultura se fez necessária para que as relações entre as pessoas fossem produtivas e não meramente toleradas, ou pior, atritantes e destrutivas. Assim, tudo que existe em forma de conquistas e realizações, antigas ou modernas se deve à opção cultural que o Homo sapiens fez em alguma altura de sua existência. É fácil imaginar que foi opção perguntando-se: por esta e não aquela direção tomou esta comunidade, enquanto aquela outra tomou direção diferente? Tomemos o exemplo de comunidades isoladas ou quase isso. Por exemplo, aborígenes australianos nem sequer entraram no chamado período neolítico (idade da pedra polida) mesmo vivendo a quarenta mil anos naquele continente e com todos os recursos à disposição. Sua opção foi por uma existência minimalista, descomplicada, de viver a cada dia sem muita preocupação a não ser com o que comer e onde se abrigar, mantendo uma relação seminômade com o ambiente. Nem por isso são menos felizes ou tem menor qualidade em suas vidas. Dos mais de um milhão de aborígenes lá existentes, só uma minoria optou por se “enquadrar” culturalmente com os brancos, a expressiva maioria vive seminua e quase isolada no Out Back.
Então, miríades de culturas se desenvolveram a partir de milhões ambientes e objetivos que os homens se propuseram ou encontraram. A cultura não se traduz em ciência exata, é mais uma mixórdia o mais das vezes ininteligível entre homem, o ambiente em que se encontra, os meios que dispõe e as ambições que possui. Além disso, tudo, o acaso, o improviso e as mudanças ambientais têm peso ponderável na feitura e propagação da cultura de um povo ou de uma nação. Aliás, acho que acaso é mais do que marca registrada de tudo que o homem construiu, mas isso pode ser explanado em outra ocasião, sob outro título.
Fato incontestável: até o anacoreta renitente isolado no meio do nada e o hippie cheio de contestação indignada contra o “sistema” estão envoltos na cultura dos povos aos quais pertencem no varejo, e na cultura geral da humanidade, em tudo que pensam, fazem ou sentem. A jaula cultural que nos envolve, aprisiona e condiciona é uma realidade onipresente e com forte viés de perenidade e infinitude. Contestar, seja de que modo for, é sempre uma manifestação cultural plena sem qualquer ressaibo de “estou fora!”. Pobre da mente que presume estar descartando seus ditames culturais, não existe essa opção, me perdoem os contestadores de qualquer nuance, matiz ou cor ideológica ou não.
Costumamos classificar, referindo-nos à origem ou meio de obtenção, as coisas tangíveis ou meramente virtuais como, naturais ou artificiais. Sendo que as primeiras, naturais, são aquelas obtidas “prontas” da natureza, num status Prêt-à-porter, por assim dizer, prontas para uso sem qualquer modificação. Frutas silvestres são um bom exemplo de produto natural. Já, as outras, artificiais, resultam da interferência direta e do labor humano para sua obtenção, são produtos que, usando insumos naturais, surgem depois que o homem as constrói. Este PC que está à minha frente é ótimo exemplo de produto artificial.
Entretanto, não só objetos tangíveis podem ser fabricados pelo Homo, a construção da sociedade humana é um produto artificial. A cultura é essencialmente artificial, não há como ser diferente, nossa sociedade foi sendo erigida ao longo de milênios graças aos esforços de milhões de pessoas, as quais contribuíram com talento e trabalho para consecução dessa imensa, maravilhosa, caótica e incontestada obra.
Esclarecendo: embora para facilitar eu tenha usado o singular, cultura, na verdade foram e são milhares de culturas, muitas já falecidas e a maioria vivendo em estreito entrelaçamento e troca de fluidos entre si na atualidade. Mas, o que foi feito de culturas que não sobreviveram, que se extinguiram depois que seus povos desapareceram? Em geral elas deixaram “rastros”, seja na forma de inserções idiomáticas que se incorporam a outras línguas, seja na arquitetura, arte, edificações, pontes e objetos de uso doméstico, ou nos costumes e tradições, nada do que “vivemos”, aprendemos ou usufruímos é cultura pura ou de um só povo. Na verdade as culturas que sobrevivem em nosso tempo são amálgamas de outras que não estão mais aí para contar sua história. Caldeirão cultural é uma expressão válida para descrever os modus vivendi atuais, nossa civilização moderna é o somatório de tudo que foi construído, gestado e descoberto pelos nossos ancestrais, nada que não saibamos, portanto.
A principal conclusão que se chega a partir dessas premissas é que as culturas atuam como uma espécie de cimento que une e “cola” os indivíduos de uma sociedade. Impensável conceber uma sociedade coesa sem objetivos e modus operandi comuns exercidos pelas pessoas que a compõe. Provavelmente seria algo anárquico e extremamente estressante, não haveria entendimento nem convergência de opiniões. Daí concluirmos que as culturas foram uma necessidade humana desde os primórdios. JAIR, Floripa, 26/01/12.

segunda-feira, 5 de março de 2012

Índia





Meu filho mais novo, Adriano, mora na Austrália e gosta imensamente de viajar pelo mundo. Numa dessas viagens conheceu Megan Markin, garota canadense que também é uma espécie de globetrotter. Hoje vivem juntos em Wolloogong, cidade próxima a Sydney e continuam viajando para ver o que há lá fora, principalmente pela Ásia e Oceania. Desse modo, estiveram em Siri Lanka, Maldivas, Indonésia e, por último, na Índia.
Já escrevi sobre esse exótico país em uma ocasião e a ele me referi assim: “Estou lendo o excelente livro “Criação” de Gore Vidal onde autor faz um retrato riquíssimo da sociedade indiana com suas castas, etnias, milhares de deuses e inúmeras religiões, e assisti ao filme ganhador de três Oscars, “Quem quer ser milionário” o qual exibe, com chocante previsibilidade, os contrastes sociais da Índia, nação onde as diferenças entre a maioria miserável e analfabeta e a elites ricas e poderosas, são milenares, aviltantes, astronômicas e sem quaisquer possibilidades de mudança num futuro previsível”.
Pois bem, nunca lá estive, portanto vou valer-me das palavras de minha nora para dar uma pincelada sobre aquelas impressões chocantes que uma sociedade tão exótica causa nas mentes ocidentais. Como disse, Megan é canadense e devemos lembrar que o Canadá é um dos países de melhor qualidade de vida do Planeta, então ela deve ter sentido com mais vigor os contrastes culturais com os quais se deparou. Vejamos suas “impressões de viagem”, obviamente com olhar primeiromundista:
Era tarde quando chegamos a Nova Delhi, no momento em que desembarcamos, Adri e eu ficamos impressionados com a fumaça no ar. Perguntamos ao motorista de táxi se havia um grande incêndio na área. Ele falava Inglês, mas parecia muito intrigado com a nossa pergunta. Era difícil respirar, o ar denso e pesado,desagradável na garganta e tóxico para os pulmões. Na manhã seguinte abrimos a janela de nosso hotel sob uma neblina espessa que cobria a cidade e não se podia ver muito longe no horizonte. Uau ... isso não é fumaça, é a poluição!”
Ela prossegue sempre surpresa: “Do nosso quarto de hotel, podíamos ouvir o ruído constante das buzinas na rua abaixo de nós. "Você está pronto para isso?". Perguntamos um ao outro. Eu havia passado semanas me preparando mentalmente para esta viagem. Bem, eu ainda estava chocada. Fomos a pé. Estradas não pavimentadas, esgoto aberto, pilhas de lixo, olhares incisivos dos habitantes locais, seguindo-nos ... perseguindo-nos como se tivéssemos $$ escrito em nossas testas. Todo mundo quer um pedaço de você na Índia”.
Abordagem: “Era sempre assim: De que país você é? Quanto tempo você está na Índia? Bastante inocente, mas quanto mais tempo você está lá, infelizmente, mais você percebe que eles estão apenas tentando passar a conversa com intuito de achacá-lo! Triste, mas verdadeiro”. Pobreza:
“A pobreza também é suficiente para mantê-lo acordado à noite. Fizemos uma prática de compra de sacos de arroz para entregá-los às crianças e aos desabrigados. Eu também acondicionei minhas sobras após cada refeição e dei o alimento para beggers na rua. Uma mulher rasgou a embalagem e começou a devorá-lo no local. Muito, muito triste”.
Taj Mahal: “Depois da caótica Nova Déli, fomos para Agra, que abriga o Taj Mahal. Fiquei surpresa ao ver que Agra não é tão turística em tudo, mas o lar de ruas ainda mais estreitas e esgoto a céu aberto. Talvez fossem os sacos de m* jogados pelas ruas (sim, literalmente, sacos cheios de m* humana, os cheiros tão intensos que eu quase vomitei por duas vezes), mas quando chegamos a nossa "pousada tradicional indiana", que eu registrei a propósito, acabei tendo uma pequena depressão”. Hotel e pousada
: “Não havia água quente para limpar-nos de toda poeira e fumaça que se infiltra no seu cabelo e roupas. O cobertor na cama também era meio pegajoso e cheirava engraçado. Uma coisa é experimentar o caos, sujeira e imundície nas ruas, mas quando você não pode sentir-se limpo no seu próprio quarto é quando a coisa realmente começa a ficar inconcebível”. “Felizmente, o hotel reservado em Jaipur era muito mais agradável. Talvez essa seja a maneira mimada de falar, mas crescendo no mundo ocidental, estamos acostumados a certos luxos e pode ser difícil ficar sem. Eu viajei para vários outros países sem água quente, cama limpa, etc, mas desta vez, devido ao sentimento tão sujo simplesmente andando pelas ruas infestadas de esgoto, eu tive o suficiente. Acho que estou oficialmente me aposentando de albergues. A Índia fez isso para mim.”
Adaptação
: “Na parte alta da cidade, compras em bazares é super divertido, tudo é tão barato (apesar de termos sido roubados o tempo todo), a comida é deliciosa. Eu acho que só levou alguns dias para nos acostumarmos com a intensidade das ruas. Então, depois de um pouco mais de uma semana na Índia, estamos nos ajustando ao barulho constante e cheiros. Nada mais que fases, que você acabou de aprender a aceitar as ocorrências bizarras como se fossem normais. Isto é, até chegarmos em Varanasi”.
“Com mais de 3000 anos, Varanasi é, aparentemente, a cidade mais antiga do mundo. Também é considerada um dos locais mais sagrados na Índia, onde peregrinos hindus vêm para lavar uma vida de pecados no rio Ganges, ou ser cremado e obter "moksha" (libertação do ciclo de nascimento e morte).
O que realmente sobressai na minha mente sobre Varanasi são as ghats de cremação às margens do rio Ganges. Os hindus consideram auspicioso morrer em Varanasi, portanto, as ghats são piras onde os corpos são cremados em plena vista, antes de suas cinzas serem jogadas no Ganges.
Essas visões e cheiros permanecerão para sempre comigo. Você só pode ser cremado aqui se morrer de causas naturais. As mulheres grávidas e crianças são consideradas karma livre, e seus corpos são amarrados a uma grande pedra e afundados no rio. O mesmo acontece com as pessoas acometidas da lepra, seus corpos também são afundados no rio. Isso me perturbou bastante, considerando-se que centenas de pessoas se banham no rio ao lado destas ghats todas as manhãs. Tenhamos em mente que este rio é também onde Varanasi tira sua água potável. Oh, o esgoto da cidade também vai para o rio.
Aqueles que se suicidaram ou não morreram de causas naturais, não são cremados nas ghats, seus corpos são apenas jogados no rio. O mesmo vale para as pessoas pobres que não têm dinheiro para comprar madeira. Isso gerou muitas epidemias no passado, mas ainda parece ocorrer nos dias atuais.
Também é importante notar que algumas partes do corpo não queimam muito bem: tórax dos homens e quadris das mulheres. As partes não queimadas do corpo são jogadas no rio, junto com as cinzas. Aparentemente, é bastante comum ver restos humanos flutuando. Felizmente, nós não testemunhamos isso durante nossa estadia.
Há um hospital localizado na ghat, onde as pessoas esperam morrer para que possam ser cremados e atirados no rio sagrado. Nós contratamos um guia para nos dizer sobre as ghats em chamas, e enquanto ele falava, eu simplesmente não conseguia escapar da fumaça ... o cheiro, sobretudo. Molhei as minhas roupas e cabelos. Muito perturbador.
Eu precisava de um minuto para refletir sobre o que eu tinha acabado de ver, então Adri e eu caminhamos até a rua para escapar da fumaça dos corpos queimados e beber um lassi. Como estávamos absorvendo tudo o que tinha a vista, um desfile de pessoas portadoras de um corpo morto passou junto a loja lassi. Eles estão no seu caminho para queimá-lo no ghat. E os moradores estão acostumados com isso. É tudo uma questão de você crescer com e onde o seu "normal" está localizado no espectro, eu suponho.
Tudo por tudo, eu estou realmente feliz por ter feito essa viagem. A viagem estava longe de ser um feriado, e deixou-nos completamente exaustos; tanto mental quanto fisicamente. No entanto, o país é o lar de mais de um sexto da população do mundo, e eu acredito que qualquer pessoa seriamente interessada em culturas do mundo deve considerar, portanto, a ver a Índia. Ela realmente abre nossos olhos para o que mais há lá fora, eu não tinha idéia. Lonely Planet India deve ser descrito como "um assalto aos sentidos"... isso resume tudo”.

Como podemos perceber, a Índia não só é mais estranha do que achamos, ela é mais estranha do que podemos conceber na nossa pasteurizada mente ocidental. A Índia não é para amadores, é para iniciados. Traduzi e adaptei partes do relato, mas para ler o texto original é só acessar o blogue: http://doukdownunder.blogspot.com/
JAIR, Floripa, 02/03/12.

sexta-feira, 2 de março de 2012

Sandices energéticas

Desde que o homem surgiu no Planeta sentiu necessidade de usar energia para facilitar sua existência. Não há consenso sobre quando o Homo usou pela primeira vez o fogo, alguns cientistas afirmam ter encontrado vestígios de fogueiras acendidas há duzentos mil anos, outros admitem que o fogo começou a ser utilizado pelo homem em torno de quarenta mil anos atrás. De todo modo, seja quando for, o fogo foi a primeira experiência humana na utilização de fonte de energia externa para seu conforto e segurança. Provavelmente a partir daí passou a assar os alimentos, aquecer as habitações e espantar animais com a nova fonte disponível, estava inaugurada a corrida tecnológica do uso de energia.
O fogo permitiu que os humanos primitivos escalassem um degrau importante rumo à civilização e, em consequência de sua posição agora um pouco mais avançada, enxergaram a possibilidade de dar novos passos. Não se sabe quando exatamente, mas tribos vizinhas de rios, lagos e dos litorais descobriram as águas como via de transporte, de modo que elas passaram a ser suas “estradas” para alcançar novas paragens, a força de remos, utilizando as correntes dos rios ou pelo uso do vento aproveitado em velas rudimentares feitas de palhas de coqueiros. Força das águas e vento parece que foram “descobertas” simultâneas.
Enquanto isso, povoações do interior aproveitavam a tração animal como força motora para puxar carros com rodas nas campinas e trenós nas regiões geladas. A roda acabara de ser “inventada” depois que se observou o corte transversal de troncos de coníferas. A humanidade estava montada em rodas e jamais abandonaria essa fantástica ferramenta que ainda hoje move o mundo.
Há que se observar que tanto o fogo como os meios de transporte se faziam a custa de madeira, mas como havia abundância desse material em relação a baixa densidade populacional, queima ou uso de madeira para a confecção do que quer que fosse não representava perigo para as florestas. Mesmo assim, existem indícios que carvão mineral na Europa central e petróleo que aflorava em certas regiões do chamado Crescente Fértil foram usados pelos povos primitivos em suas fogueiras. Uso artesanal, esporádico e localizado, mas indicando o potencial dessas duas fontes para o futuro.
Em decorrência compulsória dos novos níveis de progresso alcançados pela civilização, novas fontes de energia foram sendo usadas sem que as mais antigas fossem desprezadas, pelo contrário, quando mais crescia, mais a humanidade queimava lenha, fazia os animais puxarem seus trenós, arados e carros, usava o vento e as correntes de água para impulsionar seus barcos, mas não abandonara os remos, escravos eram uma força a ser aproveitada nas galeras e trirremes antigas.
Então, por volta de quatro mil anos atrás, no País de Gales, registrou-se a primeira mineração industrial para uso de carvão como combustível. Talvez não seja coincidência que a revolução industrial usando carvão para produzir vapor tenha ocorrido na mesma região. Esse mineral formado de restos orgânicos antigos soterrados e submetidos à pressão e calor muito acentuados, foi o que faltava para o homem finalmente “dar um tempo” para a madeira que escasseava em alguns lugares em que o desmatamento foi particularmente cruel. Em regiões onde havia poucas árvores e a turfa era abundante, esta era (ainda é) usada para queimar nas lareiras. Na Escócia e na Irlanda existem muitos campos de turfas aproveitados principalmente pelas populações rurais.
O xisto betuminoso que é uma rocha metamórfica contém entre cinco e dez por cento de óleo que pode ser aproveitado. Hoje em São Mateus do Sul no Paraná, a Petrobras está explorando jazidas importantes de xisto betuminoso com vistas a produzir combustível. Estima-se que as reservas de xisto no Planeta somem um potencial energético três vezes maior que as reservas de petróleo conhecidas. Então por que não se aproveita mais essa fonte de energia? Porque ainda não existe tecnologia que o torne viável economicamente. Talvez quando as reservas de petróleo estiverem nos estertores valha à pena explorar intensamente o xisto.
Mas o mundo foi se desenvolvendo, novas conquistas e descobrimentos alargavam o horizonte dos homens. Foi assim que em 1850, James Young, na Escócia, descobriu que o petróleo podia ser extraído do carvão e xisto betuminoso. O petróleo no início foi destilado e o querosene resultante era usado para iluminação em substituição ao óleo de baleia, imagino que os cetáceos devem ter visto com alívio a descoberta do petróleo. Depois, a história do petróleo é o que se sabe, o Planeta se convulsiona toda vez que algum árabe de maus bofes resolve acrescentar mais alguns bilhões de petrodólares a sua fortuna já bestilhorária.
Só que a humanidade foi crescendo na medida em que as fontes de energia se tornaram mais abundantes e forneceram meios para maior produção de alimentos e conforto, e isso não podia ser mais nocivo para o Planeta. Hoje grande parte dos cientistas e até de pessoas comuns sente que essa conduta irresponsável como se as fontes de energia fossem eternas é uma estultice, sentem que a civilização está numa encruzilhada: continua cega e vai ao encontro do desastre final e irreversível ou repensa seu gasto energético e trilha novos caminhos menos catastróficos.
Dá para desconfiar que os cartéis petrolíferos que controlam a economia do mundo todo, estão mancomunados (antes que o leitor pense, devo esclarecer que não acredito em teorias conspiratórias) para continuar nesse status quo até que o mundo se exploda, contanto que seus ganhos megalodônticos não sejam afetados. Parece que o “foda-se o mundo” é a política deles. Como dizia Hobbes: “O homem é o lobo do homem”. Coitado do Canis lupus, ser comparado com esse bípede imbecil!
De qualquer forma, estamos no limiar de alguma mudança muito séria e radical no modus vivendi do homem predatório, novas fontes de energia renováveis TERÃO que ser exploradas senão o fim virá mais rápido que se imagina. O crescimento populacional e a melhoria de vida dos países antes terceiro e quarto mundistas, requerem trocentos mais por cento de incremento de energia. De onde poderá sair tanta energia assim? JAIR, Floripa, 30/01/12.